Alamy Stock Photo/SOPA Images Limited

Merchandising musical: a solução estratégica para músicos que desejam construir e fortalecer sua marca

 James Nurton, escritor independente

22 de Maio de 2025

Partilhar

Da turnê recorde de Taylor Swift ao império bilionário que Rihanna construiu com sua marca de beleza Fenty, descubra como estrelas da música aplicam estratégias de merchandising para gerar receitas que chegam a superar os valores pagos pelas plataformas de streaming.

Nada se compara a ver uma apresentação ao vivo de nossos músicos favoritos – e parece que cada vez mais pessoas querem ter essa experiência. A recente turnê “The Eras Tour”, de Taylor Swift, foi a mais lucrativa da história, com um público total de mais de 10 milhões de espectadores e uma bilheteria de mais de US$ 2 bilhões. Enquanto isso, após 15 anos de separação, a banda de rock britânica Oasis anunciou recentemente que realizará uma série de shows em julho e agosto de 2025. Os ingressos se esgotaram em questão de minutos.

A popularidade dos eventos ao vivo mostra como os fãs valorizam a conexão com seus músicos e bandas favoritos. Para muitos fãs, comprar suvenires e produtos oficiais é uma forma de continuar esse relacionamento e criar um vínculo com seus heróis.

Por conta dos retornos limitados obtidos com as vendas de discos e serviços de streaming, os artigos de merchandising vêm desempenhando um papel cada vez mais importante para as estrelas da atualidade. De acordo com um relatório recente da MIDiA, o mercado global de merchandising alcançará US$ 16,3 bilhões em 2030.

É essencial que os músicos assegurem o controle dos direitos sobre seus nomes e da propriedade intelectual associada.

“Com o merchandising, os músicos podem maximizar os benefícios de seus direitos de PI, diversificando suas receitas e expandindo sua marca, além de criar mais maneiras de se conectar com os fãs”, diz Hayleigh Bosher, professora adjunta de direito de propriedade intelectual na Brunel University de Londres, no Reino Unido.

Ocorre, porém, que uma estratégia de merchandising exitosa exige uma gestão cuidadosa dos direitos de PI, como marcas e desenhos industriais, e a negociação de licenças e contratos com terceiros.

Merchandising no hip-hop: uma revolução na gestão de marca

Quem já foi a algum show ou loja de discos a partir da década de 1960 conhece bem a variedade de produtos à venda para fãs de artistas e bandas, de camisetas e cartazes a chaveiros e brinquedos.

Em alguns gêneros musicais, no entanto, o merchandising sempre teve uma contribuição mais significativa. Kevin Greene, professor da Southwestern Law School, em Los Angeles, Califórnia, destaca que, na década de 1980, os artigos de merchandising passaram a adquirir uma importância ainda maior para os artistas de hip-hop.

Greene, que recentemente publicou um artigo intitulado “Fim dos direitos de autor? A ascensão das marcas e dos direitos de publicidade na indústria da música hip-hop”, diz à Revista da OMPI: “Para muitas comunidades marginalizadas, a indústria musical era injusta, excludente e corrompida. Mas o hip-hop trouxe consigo o espírito de luta da periferia”.

Um par usado de tênis Adidas Superstar brancos com listras pretas, expostos em cima de um toca-discos com uma etiqueta RUN DMC e Adidas Originals. Parte de uma instalação artística temporária em celebração ao 40º aniversário do grupo de hip-hop.
Alamy Stock Photo/Sipa USA
Instalação artística temporária criada pela banda RUN DMC em parceria com a Adidas Originals em Nova York, em comemoração aos 40 anos do lendário grupo de hip-hop, agosto de 2023.

O docente argumenta que, historicamente, a PI discriminava os criadores musicais afro-americanos em benefício das grandes multinacionais: técnicas como a do sampling – que consiste em reutilizar uma porção (sample) de um som já gravado em uma nova gravação – eram condenadas e o sistema de direitos de autor não reconhecia adequadamente as obras criadas por afro-americanos. Segundo Greene, a situação começou a mudar quando, em 1986, a banda de hip-hop Run DMC “chegou chutando a porta” ao se tornar a primeira banda a firmar uma parceria com uma grande marca esportiva, lançando a canção “My Adidas”.

A estratégia da Run DMC foi seguida por outros artistas como Drake e Travis Scott (ambos com a Nike), Jay-Z (Puma) e Cardi B (Reebok). Hoje, diz Greene, “ter um contrato com uma marca logo de cara é quase que obrigatório”.

Marcas de roupa de celebridades e colaborações no universo da moda

Alguns músicos chegam a criar suas próprias marcas de moda ou trabalham com grifes de luxo na criação das peças. Rihanna lançou sua marca de produtos de beleza Fenty Beauty em 2017 e liderou a marca de moda Fenty (pertencente ao grupo LVMH) de 2019 a 2021. Em 2014, a artista também iniciou uma parceria com a Puma, assinando a linha de produtos Fenty X Puma. Segundo estimativas, Rihanna tem uma fortuna de cerca de US$ 1,4 bilhão, derivada em grande parte da Fenty Beauty e de seus outros empreendimentos comerciais.

Uma das decisões mais importantes que os músicos precisam tomar é se desenvolverão sua própria marca, garantindo total controle e liberdade criativa, ou trabalharão com um licenciado.

O músico estadunidense Pharrell Williams atualmente é diretor criativo da linha masculina da grife Louis Vuitton. Em janeiro de 2025, Williams e o DJ e estilista japonês Nigo apresentaram uma coleção de streetwear masculino na Semana de Moda de Paris que foi aclamada pela crítica.

E o dinheiro não está só na indústria da moda. A rapper Megan Thee Stallion, por exemplo, tem contratos com a Nike, Revlon, Cash App e Popeyes. Em 2014, o lendário artista e produtor Dr. Dre vendeu sua empresa de fones de ouvido Beats by Dre para a Apple por US$ 3 bilhões.

Como os artistas podem proteger suas marcas por meio do registro

Embora estratégias exitosas de merchandising sejam extremamente recompensadoras, principalmente para músicos consolidados com uma ampla base de fãs, vários obstáculos precisam ser superados.

1. Controle do nome artístico

Em primeiro lugar, é fundamental que os músicos assegurem o controle dos direitos sobre seus nomes e da propriedade intelectual associada, como logotipos e imagens. Na cena do K-pop, por exemplo, já houve uma série de litígios entre agentes e cantores e bandas (incluindo o rapper G-Dragon e o grupo iKON) em torno da titularidade dos direitos de uso de nome.

Em geral, essas controvérsias surgem quando integrantes da banda entram ou saem do grupo. Os ex-integrantes da The Rubettes, banda britânica que fez sucesso nos anos 1970 com a canção “Sugar Baby Love”, se viram envolvidos em uma batalha judicial após um deles tentar registrar a marca “Rubettes” no Reino Unido e na União Europeia. No fim, o pedido de registro da marca no Reino Unido foi invalidado por decisão do Tribunal Superior, enquanto o registro da marca na União Europeia foi cancelado.

2. Proteção de marca para todos os bens e serviços

O segundo ponto importante é garantir que os registros de marca abarquem todos os produtos e serviços necessários em todas as jurisdições relevantes. Para isso, o Sistema de Madri, que atualmente abrange 130 países, pode ser uma ferramenta inestimável. Os pedidos de registro de marca também devem abranger eventuais produtos planejados para o futuro, levando em conta os períodos de graça para demonstrar o uso da marca.

3. Proteção de desenhos de produtos e artigos de moda de celebridades

Em terceiro lugar, outros direitos de PI, como desenhos industriais registrados e o direito de publicidade (nas jurisdições que o adotam), podem ser relevantes. Os direitos sobre desenhos industriais desempenham um papel essencial em setores como o de moda e moveleiro. No entanto, por serem figuras de grande visibilidade pública, os músicos precisam estar particularmente atentos aos requisitos de novidade e ao risco de terem seus desenhos invalidados por divulgações prematuras.

A ação judicial da Puma contra a Forever 21 por suposta cópia de calçados da linha Fenty by Rihanna

Esse risco foi evidenciado em um caso recente julgado pelo Tribunal Geral da União Europeia (Caso T-647/22) envolvendo um desenho comunitário registrado (DCR) de uma coleção de calçados da Puma, que foi a autora da ação. O DCR é um direito unitário de desenho industrial que confere proteção em todo o território da União Europeia. Em maio de 2025, todos os desenhos comunitários passaram a se chamar desenhos da União Europeia (DUE), após alterações no Regulamento da UE sobre Desenhos (EUDR).

No caso Puma contra Forever 21, o tribunal manteve a decisão de que o desenho do produto carecia de caráter individual, uma vez que Rihanna havia divulgado fotos do calçado em seu perfil no Instagram e em outras plataformas em dezembro de 2014.

A corte assentou que, como Rihanna era uma estrela pop mundialmente famosa em dezembro de 2014 (mais de 18 meses antes do depósito do pedido de DCR), seus fãs e especialistas do setor de moda já haviam desenvolvido um interesse particular pelos calçados que a cantora usava no dia em que assinou o contrato com a Puma.

“Nesse sentido, é perfeitamente razoável considerar que uma parcela não insignificante das pessoas interessadas na música ou na pessoa de Rihanna, incluindo sua vestimenta, em dezembro de 2014 observaram atentamente as fotos em questão para, a partir delas, discernir a aparência dos calçados usados pela artista, reconhecendo assim as características do desenho anterior”, escreveu o relator na decisão.

A Puma recorreu da decisão, mas o Tribunal de Justiça da União Europeia negou a admissibilidade do recurso (Caso C‑355/24 P), o que significa que a decisão é definitiva.

Construir a própria marca ou promover outras marcas: um dos dilemas dos músicos

No complexo mundo da gestão e proteção dos direitos de PI, uma das decisões mais importantes que os músicos precisam tomar é se desenvolverão sua própria marca, garantindo total controle e liberdade criativa, ou trabalharão com um licenciado, o que pode reduzir os custos iniciais mas, ao mesmo tempo, significa menos controle e uma participação menor nas receitas.

Seja qual for a abordagem adotada, diz a professora Bosher, “os artistas devem garantir que recebam uma parcela justa da receita gerada pela venda de seus artigos de merchandising. Já vimos casos em que, por conta de taxas de comissão abusivas, a casa de show ganhou mais com os produtos vendidos no evento do que os próprios artistas”.

Aplicação dos direitos de marca a produtos não oficiais

Embora o merchandising ofereça enormes benefícios, também existem alguns riscos significativos, entre os quais o de litígio. Ao lançar qualquer programa de merchandising, é fundamental assegurar o respeito aos direitos de propriedade intelectual de terceiros. Esse ponto torna-se ainda mais relevante quando o artista decide explorar novas linhas de produtos em mercados onde já existem marcas consolidadas.

Em alguns casos, os músicos também precisam recorrer à Justiça para fazer valer seus direitos. Em 2013, Rihanna processou a varejista de moda britânica Top Shop por comercializar camisetas com a sua foto. O Tribunal de Recursos manteve a decisão de primeira instância que reconheceu a existência de contrafação, já que alguns membros do público relevante poderiam pensar que as camisetas eram aprovadas pela cantora.

Em 2016, a Run DMC moveu uma ação contra a Walmart, a Amazon e outros varejistas nos Estados Unidos, alegando que essas empresas estavam comercializando, sem autorização, produtos com o nome da banda. O grupo pleiteou uma indenização de US$ 50 milhões. O rapper RZA, da banda Wu-Tang Clan, também teria processado marketplaces online pela venda de produtos piratas.

Parcerias com celebridades que deram errado

Em alguns casos, a superexposição ou comportamentos ultrajantes podem ser prejudiciais e resultar no rompimento de parcerias comerciais.

Um caso que exemplifica os perigos da superexposição é o do rapper MC Hammer. “No início da década de 1990, o artista estava em todos os lugares”, afirma o professor Greene. Nesse período, MC Hammer era garoto propaganda da Taco Bell, Pepsi e KFC e estrelava o programa de desenho animado “Hammerman”. Pouco tempo depois, porém, o rapper começou a perder credibilidade e ser ridicularizado. “O que acabou com ele foi o excesso de exposição (e de gastos)”, escreve o professor Greene.

Já em relação a comportamentos negativos, Greene descreve a experiência de Kanye West como “um caso que serve de alerta”. Em 2024, a Adidas encerrou sua parceria de 10 anos com o rapper americano e retirou todos os calçados Yeezy do mercado depois que West fez comentários antissemitas. Travis Scott é outro rapper que perdeu contratos milionários depois que 10 pessoas morreram em um de seus shows em 2021.

Equilíbrio entre arte e comércio

O crescimento do merchandising musical pode incomodar os puristas do rock’n’roll, e astros da música como Prince são conhecidos por nunca terem feito acordos comerciais. Mas em uma indústria onde as carreiras podem ser curtas e terminar abruptamente, o merchandising pode ser uma estratégia poderosa e lucrativa.

Como observa o professor Greene, na atual cultura das celebridades, “as superestrelas musicais também são influenciadoras digitais e suas marcas dependem de direitos de marca e dos direitos de autor”.

Em um mundo ideal, diz Bosher, os músicos conseguiriam viver apenas do seu trabalho, enquanto o merchandising seria mais uma forma de fortalecer a conexão com os fãs do que uma estratégia de diversificação de receita. Essa, no entanto, não é a realidade hoje.

“Uma estratégia de merchandising cuidadosamente elaborada pode ser uma excelente maneira de aprofundar a conexão dos fãs com a música que eles tanto amam”, diz a docente. “Além disso, é uma ótima maneira de os fãs apoiarem seus artistas preferidos, desde que a receita da venda dos produtos vá efetivamente para os artistas, o que infelizmente nem sempre acontece”.

Músicos e bandas, além de serem os titulares dos direitos de autor sobre suas músicas, também podem proteger seus nomes e logotipos como marcas registradas. Com isso, os artistas podem fortalecer a relação com os fãs por meio de suvenires e produtos oficiais. Com a ampliação da sua base de fãs, as bandas podem se valer dos direitos de marca para garantir exclusividade no uso de seus nomes e logotipos. Saiba mais sobre as marcas e todos os direitos de PI que protegem as obras musicais ou continue a ler a edição especial da Revista OMPI com foco na música.