OMPI

Examinar patentes, marcas e desenhos industriais: a arte dos examinadores de PI.

James Nurton, escritor independente

14 de Novembro de 2025

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Os examinadores desempenham papel fundamental no sistema de propriedade intelectual (PI), estabelecendo quando os pedidos de patente ou registro de marca, indicação geográfica e desenho industrial podem ser concedidos e garantindo o cumprimento dos requisitos previstos em leis e tratados internacionais. Todos os anos, esses especialistas realizam revisões rigorosas, efetuam pesquisas e decidem sobre mais de 20 milhões de pedidos de PI. Mas um número considerável deles faz muito mais que isso.

O fato de boa parte da atividade dos examinadores de PI ser confidencial e técnica faz com que por vezes esse trabalho seja mal compreendido. Em vista disso, para saber melhor em que efetivamente consiste essa atividade, a Revista da OMPI se reuniu com examinadores de cinco institutos de PI – distribuídos por quatro continentes – para falar sobre seu lugar no sistema e entender a evolução do papel de examinador ao longo do tempo.

O papel do examinador de propriedade intelectual

A principal tarefa dos examinadores é garantir que os direitos de PI sejam devidamente concedidos e que a legislação seja interpretada de maneira justa. É uma grande responsabilidade, como explica a examinadora de patentes paquistanesa Saima Kanwal: “Meu trabalho é conceder, quando é o caso, a proteção devida, e é também proteger o domínio público, evitando a criação no mercado de monopólios desnecessários”.

Para os institutos de PI que submetem os pedidos de patente a exame substantivo, isso significa recorrer à experiência do examinador e às ferramentas de última geração para determinar se a invenção que consta do pedido cumpre os requisitos de novidade, não obviedade e todos os demais critérios que permitem que ela seja patenteada.

“Nosso trabalho nos proporciona este privilégio: conhecemos as inovações antes de elas serem divulgadas.”

No caso do registro de marcas, trata-se de avaliar se a marca tem caráter distintivo e se isso afeta os direitos de terceiros. Ana Isabel Varona Guzmán é examinadora de marcas coletivas na Colômbia. “Eu desenvolvi um olhar crítico”, diz ela, “para, por exemplo, determinar se as marcas tendem a gerar confusão ou se o sinal que a pessoa deseja proteger como marca pode afetar os direitos de terceiro ou uma denominação de origem”.

Mesmo no caso de institutos que se limitam a analisar os aspectos formais dos pedidos de patente e não os avaliam em relação aos requisitos de novidade e atividade inventiva, entre outros critérios, os examinadores desempenham um papel importante. “O exame formal não significa simplesmente que abrimos as portas para que tudo seja aceito”, diz Eno-obon Usen, examinadora sênior de patentes do Instituto de Patentes do Registro de Marcas, Patentes e Desenhos Industriais da Nigéria. “Analisamos os documentos detalhadamente e então interagimos com os requerentes. Oferecemos a eles informações mais abrangentes sobre o que é a propriedade intelectual e depois auxiliamos aqueles que não sabem como estruturar ou formular suas reivindicações.”

Uma pessoa sentada a uma mesa em um escritório moderno examina cuidadosamente um documento, trajando um colete escuro sobre uma blusa verde-azulada, com luz natural incidindo através do espaço.
Getty Images/Portra

O trabalho dos examinadores requer boa dose de curiosidade e olhar minucioso, assim como um conhecimento exaustivo da legislação. “Você precisa estar atenta aos detalhes, precisa fazer muitas pesquisas”, diz Xia Wu, examinadora de desenhos industriais do Instituto Canadense de Propriedade Intelectual (CIPO). Felizmente, os examinadores não precisam dar conta disso sozinhos.

Trabalho em equipe: por que a cooperação é fundamental

O trabalho dos examinadores não é uma atividade exclusivamente individual; a colaboração é parte crucial do seu dia a dia. Para Usen, toda semana começa com uma reunião às 9 da manhã, da qual participam os seis examinadores de patentes do instituto nigeriano. O objetivo é analisar os pedidos depositados recentemente e compartilhar as questões com que cada examinador está lidando em seu trabalho. A equipe também faz consultas aos examinadores de marcas e desenhos industriais, explica ela, com o intuito de oferecer um auxílio mais fundamentado a requerentes que por vezes não têm muita clareza sobre qual direito de PI melhor se adequa a seu caso.

“Sempre que nos deparamos com algo que nunca tínhamos visto antes, levamos isso para discutir com a equipe.”

Margarita Alonzo, examinadora de patentes especializada em recursos genéticos e bioquímica, faz parte da equipe de quatro examinadores do departamento de patentes do Ministério da Economia da Guatemala. “Em geral, discutimos questões de trabalho quando estamos elaborando nossos relatórios para o Ministério da Saúde Pública ou para o Ministério da Agricultura, que é algo que precisamos fazer diariamente”, diz ela. “Precisamos ter certeza de que a informação que estamos compartilhando é correta e que não estamos violando os direitos de ninguém, mas também precisamos estar seguros de que não estamos concedendo direitos além do que é devido.”

Duas pessoas sentadas de frente uma para a outra em um escritório, discutindo um assunto junto a uma mesa com tampo de mármore sobre a qual se veem um notebook, papéis e materiais de escritório.
Getty Images/Antonio_Diaz

“Realizamos reuniões de equipe regularmente para compartilhar informações e boas práticas, de modo a garantir a consistência e a qualidade do nosso trabalho”, diz Wu sobre a atuação de sua equipe no CIPO. “Sempre que nos deparamos com algo que nunca tínhamos visto antes, levamos isso para discutir com a equipe e formulamos uma abordagem consistente para lidar com a questão.”

A formação das próximas – e das atuais – gerações de examinadores de PI

Além das atividades diretamente relacionadas com o exame de pedidos, os examinadores também precisam dedicar parte de seu tempo a treinar e acompanhar o trabalho dos profissionais mais novos, sem os quais o segmento seria levado à estagnação.

No Canadá, por exemplo, há um programa de treinamento para cada novo grupo de examinadores que começa a trabalhar no CIPO. “Em meus 18 anos aqui, treinei um grande número de jovens profissionais”, diz Wu, que recebeu o Prêmio de Mérito do Diretor-Geral por seu trabalho de formação e mentoria. “Mas o programa evoluiu ao longo dos anos. Atualmente, os novos examinadores têm várias semanas de formação em sala de aula para se familiarizar com a legislação, e então passam vários meses sendo treinados e acompanhados por examinadores sênior.”

Muitos institutos também recorrem a formações externas oferecidas pela Academia da OMPI, por especialistas da área e por institutos de PI mais consolidados. Kanwal recorda os 15 dias de treinamento que recebeu de examinadores de PI da Austrália no início de sua carreira no Paquistão, bem como uma formação mais recente, com foco em biotecnologia, oferecida pelo Instituto Dinamarquês de Marcas e Patentes. Ela também elogia o “treinamento personalizado e focado” oferecido por um membro da Divisão de Cooperação Internacional do Tratado de Cooperação em matéria de Patentes (PCT) da OMPI.

Na Guatemala, Alonzo destaca os cursos à distância oferecidos pela Academia da OMPI, entre outros, que vêm beneficiando diversos institutos de PI latino-americanos. Na Nigéria, Usen menciona os treinamentos ministrados por examinadores do Japão, da China e dos Estados Unidos, assim como pelo Instituto Europeu de Patentes (IEP) e pela OMPI. “Em minha opinião, os cursos de ensino à distância ajudam muito”, diz ela. “Decidimos torná-los obrigatórios para os jovens examinadores, para que eles tenham um conhecimento amplo e aprofundado de todos os aspectos do trabalho.”

Os examinadores júnior não são os únicos a se beneficiar de programas de treinamento. A formação continuada é importante para examinadores de todos os níveis, pois, embora os aspectos fundamentais do trabalho ainda sejam os mesmos, no dia a dia o trabalho mudou bastante nas últimas duas décadas, em parte devido às novas tecnologias e em parte devido a mudanças na legislação.

Um grupo de adultos sentados em carteiras, com notebooks, em uma sala de aula moderna e bem iluminada; uma pessoa em primeiro plano faz anotações enquanto escuta com atenção.
Getty Images/FatCamera

Para Alonzo, as maiores mudanças foram a adoção da Base de dados PATENTSCOPE e a adesão ao PCT pela Guatemala em 2006. Em sua área de especialidade, a biotecnologia, ela diz que a próxima grande mudança será a implementação do Tratado sobre Propriedade Intelectual, Recursos Genéticos e Conhecimentos Tradicionais Associados , que foi aprovado no ano passado.

Na Nigéria, Usen diz que o número de pedidos de patente passou de aproximadamente 500 ao ano em 2006 para mais de 2 mil atualmente. Para dar conta do volume de trabalho, os examinadores precisaram se adaptar à modernização digital e às ferramentas online, muitas das quais exigem treinamento adicional.

Para os examinadores de desenhos industriais, a tecnologia não só ampliou o alcance de suas buscas sobre o estado da técnica, como também agilizou o processo de exame – e, para muitos designers cujos produtos têm vida útil curta, rapidez é essencial. “No passado, trabalhávamos com arquivos em papel. No caso de pedidos com 300 desenhos, precisávamos levar tudo para a sala da diretoria e distribuir as páginas pela mesa de reuniões, que é enorme”, conta Wu. Atualmente os pedidos são depositados eletronicamente, o mesmo acontecendo com as respostas, e seu recebimento é instantâneo. “O tempo de tramitação dos pedidos diminuiu muito.”

Acessibilidade: a PI ao alcance de todos

Além de examinar pedidos e treinar profissionais mais inexperientes, os examinadores de PI muitas vezes participam de esforços de conscientização sobre o sistema de PI e de iniciativas para tornar o sistema mais acessível a todos os agrupamentos sociais.

Na Nigéria, os examinadores de patente têm contribuído com a formação em PI em universidades por meio da criação de Centros de Apoio à Tecnologia e à Inovação (TISCs), reunindo-se uma vez por mês para discutir o alcance do programa e avaliar seus resultados. “Discutimos os casos de universidades que não têm formação em propriedade intelectual no currículo ou mesmo como parte do curso de suas faculdades de Direito”, diz Usen. “Também colaboramos com a criação de clubes de PI em diferentes universidades. O objetivo é conscientizar a comunidade universitária e incentivar que mais advogados ofereçam cursos sobre PI como disciplina optativa em suas universidades, além de fornecer informações sobre PI a alunos de ciências e engenharia.”

“A PI não envolve apenas a proteção dos direitos de empresas multinacionais, mas também o apoio a inventores locais.”

Kanwal liderou projetos que resultaram no estabelecimento de 48 TISCs no Paquistão, além de ter contribuído com a criação de uma plataforma para mulheres inventoras. “Temos um serviço telefônico de auxílio a empresárias e inventoras e oferecemos mentorias para elas por meio da plataforma”, explica a examinadora paquistanesa. “Em vez de passar o dia sentada em uma mesa, agora eu interajo com parceiros e outros atores do sistema de PI em âmbito internacional. No meu instituto, as iniciativas de conscientização e apoio ao sistema estão entre as responsabilidades de todos os examinadores de patentes.”

Kanwal também elaborou um modelo de referência para as iniciativas de registro e comercialização de ativos de PI das instituições de ensino superior no Paquistão. O trabalho contribuiu para que os pedidos nacionais de patente no Paquistão aumentassem de 20% para cerca de 50%. “Por meio de projetos como o programa de assistência a inventores, podemos estender a mão para as pessoas que estão desenvolvendo invenções e lhes oferecer mentorias individuais”, diz Kanwal, que enfatiza que a conscientização crescente é uma prova de que o sistema de patentes “não envolve apenas a proteção dos direitos de empresas multinacionais, mas também o apoio a inventores e empreendedores locais”.

Na Guatemala, Alonzo se interessa especialmente pela relação entre PI e o acesso a recursos genéticos locais. “Venho de um lugar que se caracteriza pela grande diversidade social e também por uma enorme biodiversidade e pela interação com a cultura maia.” Ela conta que descobriu a importância dos recursos genéticos e dos conhecimentos tradicionais graças aos medicamentos naturais de sua avó.

Proteção ao patrimônio e à comunidade por meio de direitos de PI

A consciência em relação à necessidade de proteger o patrimônio local e seu impacto sobre as comunidades é cada vez maior. Durante a pandemia de Covid-19, Alonzo ajudou a criar a seção guatemalteca da Organização para as Mulheres na Ciência para o Mundo em Desenvolvimentoe acabou entrando em contato com cientistas que viviam fora do país. A entidade organiza eventos gratuitos para valorizar a atividade científica e procura atingir garotas de todo o país. “Sei que tenho uma condição privilegiada, mas não quero ser uma exceção”, diz ela. “Desejo que todas as meninas, ou ao menos mais meninas, tenham as oportunidades que eu tive de ir para a universidade e estudar ciências, tecnologia, engenharia e matemática, que são áreas fundamentais para a inovação e o avanço tecnológico.” Ela também tem ajudado mulheres indígenas a encontrar maneiras de obter proteção para seus produtos têxteis.

Uma mulher maia em San Antonio Palopó, na Guatemala, segurando uma peça de fazenda azul-celeste tecida à mão.
Getty Images/Kryssia Campos

Especializada em marcas coletivas, direitos de certificação e denominações de origem, Varona Guzmán trabalha junto a comunidades locais na Colômbia. “Parte do meu trabalho envolve conscientizar as comunidades e ensiná-las a usar algumas ferramentas úteis para proteger seus produtos ou serviços”, diz ela. “Também preciso ler muito e, em certos casos, tenho que recorrer a outras agências governamentais para que me ajudem a lidar com determinadas questões técnicas que eu, como advogada, não sou capaz de entender.”

Ao longo dos últimos 13 anos, Varona Guzmán testemunhou melhorias nas disposições legais e na acessibilidade, além da expansão da proteção a produtos agrícolas e comunitários. “Com nosso trabalho agregamos valor a produtos que, embora conhecidos, não recebiam o devido crédito até serem agraciados com o prêmio de uma denominação de origem, por exemplo. Por outro lado, ajudamos as comunidades a entender que embora agora detenham um direito, elas também têm diversas responsabilidades.”

Colher os benefícios do exame de PI

O trabalho dos examinadores continua a evoluir, acompanhando as inovações tecnológicas, as tendências emergentes no mundo dos negócios e as mudanças jurídicas. Tais revisões asseguram não apenas que seu papel permaneça relevante, mas também que eles continuem a enfrentar desafios e decisões interessantes ao trabalhar para preservar a integridade do sistema de PI. As vantagens desse trabalho são muitas e variadas, não só para os requerentes, mas também para os próprios examinadores.

Para Wu, um dos benefícios é ver designs que ela submeteu a exame chegarem às vitrines das lojas. Para Kanwal, foi extremamente gratificante saber que as vacinas que ela examinou iriam salvar vidas durante a pandemia de Covid-19.

“Foi uma sensação muito especial saber que de alguma forma eu havia contribuído com esses pedidos antes de eles chegarem ao mercado”, diz ela. “Nosso trabalho nos proporciona este privilégio: conhecemos as inovações antes de elas serem divulgadas”, diz Alonzo. “Mas também temos a responsabilidade de incentivar o sistema de inovação.”

É por isso que, embora muitos inicialmente não pensassem em seguir uma carreira na área de PI, os examinadores consideram seu trabalho gratificante e recompensador. Como diz Usen, no trabalho de examinador, você está sempre aprendendo algo novo. “Uma vez eu ouvi um conferencista dizer: em PI, quanto mais você se aprofunda, mais se deslumbra. É isso mesmo.”

O projeto Reconhecimento e Empoderamento dos Examinadores de PI foi lançado em janeiro de 2025 e culminou com uma celebração em honra dos examinadores de PI durante todo o mês de novembro de 2025. Todas as entrevistadas integraram a Galeria de Agentes de Mudança e foram indicadas por seus institutos nacionais de PI.