Registro:
2020.0000960930
ACÓRDÃO
Vistos,
relatados e discutidos estes autos do Apelação Cível nº
1112485-53.2019.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante RÁDIO E TELEVISÃO
RECORD S.A., é apelado LUIS FERNANDO DE MOURA.
ACORDAM, em
9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a
seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U. Sustentou
oralmente o Dr. Eduardo Srour Pinheiro - OAB/SP 359.115.", de conformidade
com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O
julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores GALDINO TOLEDO JÚNIOR
(Presidente), JOSÉ APARÍCIO COELHO PRADO NETO E EDSON LUIZ DE QUEIROZ.
São
Paulo, 24 de novembro de 2020.
GALDINO TOLEDO JÚNIOR RELATOR
Assinatura
Eletrônica
Apelação
Cível nº 1112485-53.2019.8.26.0100 Comarca de São Paulo
Apelante:
Rádio e Televisão Record S.A Apelado: Luís Fernando de Moura
Voto
nº 29.255
RESPONSABILIDADE CIVIL - Ação
indenizatória cumulada com
obrigação de fazer, fundada em suposta violação a direito autoral - Reprodução
de fotografias e imagens de trabalho deste, fotógrafo profissional, em site de
notícias “R7”, de responsabilidade da emissora ré, sem nele indicar o crédito
em nome daquele - Sentença de procedência - Inconformismo exclusivo da empresa
demandada - Descabimento - Comprovação de violação ao disposto contido no
artigo 79 e § 1º da Lei nº 9.610/98 - Dano moral que dispensa outras provas, decorrendo
exclusivamente da omissão acima - Manutenção do édito condenatório fixado a
este título no valor R$ R$7.525,00, que não se mostra exacerbado ante as
circunstâncias do caso - Sentença mantida - Apelo desprovido.
1.
Ao
relatório constante da sentença de fls. 141/143, acrescento que esta julgou
procedente ação reparatória por danos morais, cumulada com obrigação de fazer
proposta por Luís Fernando de Moura, fundada em reprodução de obra fotográfica
de sua autoria, em site de notícias da Rádio e Televisão Record S.A, sem a
devida menção do nome daquele, fixada a reparação moral devida em R$7.525,00.
Condenou ainda a demandada informar os créditos em nome do autor nas publicações
das fotografias indicadas na petição inicial, no prazo de cinco dias, sob pena
de multa diária de R$300,00, limitada a R$50.000,00. Em razão da sucumbência a
emissora ré foi condenada ao pagamento das custas e despesas processuais, e em
honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da condenação.
Volta-se
somente esta, às fls. 196/216, objetivando, em resumo, a inversão do resultado
da demanda, aduzindo, em síntese, que a divulgação das fotografias se ateve ao
direito de informação jornalística, estando amparado no direito à liberdade de
expressão, nos termos do artigo 220 e 221, da Constituição Federal. Defende que
não houve da má-fé dolo ou intenção de apropriar-se da obra produzida pelo
demandante, até porque adquiriu em bancos de imagens cedidas às agencias
comercializadoras. Dessa forma, não há violação de direito autoral ou
impedimento à sua veiculação, não podendo ser responsabilizada por não indicar
nas fotografias o nome do apelado. Considera que as reportagens veiculadas não
denigraram a obra deste e, tampouco, conteve apelo comercial, mas tão somente
se utilizou das imagens como pano de fundo, para a veiculação da informação
desejada, conforme indicado às fls. 22, 24/25, 26/27, 28/30. De qualquer forma,
cumprida a obrigação de fazer imposta e, ausente os elementos subjetivos da
responsabilidade civil (conduta ilícita e culpa), descabida a incidência de
multa diária, bem como à indenização perseguida, ou, ao menos, a sua redução em
atenção aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
Recurso
regularmente processado, com oferecimento de resposta às fls. 249/264.
2.
Não
comporta acolhida o apelo, nos estritos termos em que manifestado.
Com
efeito, dispõe o artigo 7º da Lei 9.610/98: “São obras intelectuais protegidas as
criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte,
tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como... VII
as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia
”.
Em
complemento, rege o mesmo diploma legal em seu artigo 24 que: “São direitos morais
do autor: I o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra; II o de ter seu
nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor,
na utilização de sua obra”.
Já
o artigo 29, seguinte determina que: “Depende de autorização prévia e expressa do
autor a utilização da obra, por quaisquer modalidades, tais como: I a reprodução
parcial ou integral” .
Por fim, o artigo 79 e § 1º,
dispõe: “O autor de obra fotográfica
tem direito a reproduzi-la e colocá-la à venda, observadas as restrições à exposição,
reprodução e venda de retratos, e sem prejuízo dos direitos de autor sobre a obra
fotografada, se de artes plásticas protegidas. § 1ºA fotografia, quando utilizada por terceiros, indicará de forma legível
o nome do seu autor” (destaquei).
No
caso dos autos, o demandante comprovou a autoria das fotografias objeto da
lide, indicadas na inicial (fl. 3) e documentalmente carreadas às fls. 22/35,
sendo que a ré se utilizou destas ao reproduzi-las em seu site de notícias
“R7”, mas sem a expressa indicação do nome de seu autor.
Em
suas razões de recurso a apelante não negou o fato, aduzindo apenas que por terem
sido as fotografias cedidas/comercializadas para “agências comercializadoras” ,
não há violação de direito autoral ou impedimento a sua veiculação, não podendo
ser responsabilizada por não indicar nas fotografias o nome do apelado.
Logo,
cinge-se a controvérsia exclusivamente quanto à suposta violação ao disposto
contido no artigo 79 e § 1º da Lei 9.610/98, fato que legitimaria o pleito de
danos morais.
No
caso concreto, a despeito da cessão comercial das fotografias para outras
agências de bancos de imagens como o “Estado, WPP/Folhapress Reuters e Lance”
e, estas, por sua vez, comercializaram para a emissora ré (fls. 85/109), não
exime a responsabilidade desta de divulgar a informação dos créditos nas
imagens, com menção específica do nome do demandante, na forma orientada pela mencionada
legis.
Logo,
inegável o direito do demandante de reivindicar seu cumprimento (inserção da
informação dos créditos), sem prejuízo do correspondente pleito de indenização
por danos morais.
Isto
porque, a simples divulgação de um trabalho na Internet não representa renúncia
aos direitos morais de autor, mormente no caso dos autos, onde a publicação das
fotografias foi realizada sem expressa menção do nome de seu criador, não
havendo como ser suprida esta violação pela indicação das mencionadas agências
comercializadoras.
Nesse
cenário, como bem analisado pela julgadora monocrática, não destoou a sua
conclusão, que se mostra pertinente reproduzi-lo: “(...) A Lei 9.610/98, em seu
art. 7º, VII, protege as obras fotográficas, garantindo aos seus autores direitos
morais e patrimoniais (art. 22 do mesmo diploma). E, conforme art. 22 do mesmo diploma,
'pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou'. Os
documentos de fls. 22/34 demonstram que as fotografias são de autoria do autor e
que a ré, ao publicá-las, informou como origem os bancos de imagens Folhapress,
Agência Estadão, Reuters e Lance, mas não indicou a autoria, em ofensa ao art. 79,
§ 1º, da Lei 9.610/98” .
E
pondera: “De fato, como foi informado na peça inicial, o autor negociou as fotografias
com os bancos de imagens, e estes, por seu turno, firmaram contratos de licenciamento
com a ré (fls. 85/105). Portanto, não caberia queixa sobre eventual direito patrimonial
que decorre da licença de uso dessas imagens (art. 49 e 50, da Lei n. 9.610/1998)”
.
Todavia,
“a transmissão dos direitos do autor sobre sua obra não compreende os de natureza
moral (§ 1º do art. 49 do diploma em lume) advindos da publicação das fotografias
sem o devido crédito, como reza o art. 79 acima aludido, e, portanto, o pedido inicial
merece guarida” .
Portanto, demonstrada responsabilidade
da emissora ré pela veiculação das fotografias em site de notícias “R7”, sem a
devida informação dos créditos do autor, os danos morais dispensam outras
provas, ainda que não tenha aquela agido com dolo, o artigo 186 do Código Civil
é expresso no sentido de que aquele que, também por culpa, causar dano a alguém
está obrigado a repará-lo.
No
que toca à quantificação dos danos morais, importa lembrar a lição sempre atual
de Yussef Said Cahali, para quem: “A sanção do dano moral não se resolve numa indenização
propriamente dita, que indenização significa eliminação do prejuízo e das suas consequências,
o que não é possível quando se trata de dano extrapatrimonial; a sua reparação se
faz através de uma compensação, e não de um ressarcimento; impondo ao ofensor a
obrigação de pagamento de uma certa quantia em dinheiro em favor do ofendido, ao
mesmo tempo em que agrava o patrimônio daquele, proporciona a este uma reparação
satisfativa ” (Dano e Indenização, RT 1980, p. 26).
Sendo
o dano moral diverso daquele considerado material, sua apreciação e valoração
pecuniária tangem questões pessoais de difícil mensuração, de modo que o
prudente discernimento do julgador para fixar o respectivo montante indica não
só a maior amplitude de sua responsabilidade, como também exige atenção impar,
a fim de que seja feita a devida justiça, de modo a não onerar o agente de modo
excessivo, tampouco descaracterizar o instituto compensatório da indenização.
Nessas
condições, ao fixar o valor da indenização, deve o julgador atentar para as
circunstâncias da causa, o grau de culpa do causador, as consequências do ato,
as condições econômicas e financeiras das partes, de forma a não permitir que o
valor deferido premie imoderadamente o ofendido, mas também não seja tão ínfimo
que estimule seu causador a não cessar seu proceder incorreto.
Nessa
senda, como já se decidiu a respeito: “O limite é o da reparação do dano, verificado
caso a caso, tendo como parâmetros o desestímulo à leviandade e à repetição da ofensa,
sem perder de vista a capacidade econômica do ofensor, de um lado, e de outro a
resposta capaz de trazer conforto a quem teve direito vulnerado; não se destina,
em verdade, a proporcionar alegria ou vingança para o ofendido, mas tão-somente
à satisfação contida do desagravo; por isto, não guarda relação de proporcionalidade
necessária com a dor, sempre subjetiva, mas tem a finalidade de representar pagamento
por aquilo que não tem preço, lenitivo para o que não tem remédio. Serve, enfim,
para dissuadir o ofensor de repetir a conduta gravosa sem aniquilar sua vida civil;
para desfalcá-lo patrimonialmente sem fazê-lo insolvente ou escravo da própria incúria.
A condenação é mais moral do que pecuniária, mesmo quando a necessidade de reprovação
do ato e as situações socioeconômicas do ofensor e do ofendido comportem a fixação
de valor elevado ” (TJSP ? 4ª Câmara de Direito Privado - Apelação Cível n. 20.901-4).
Atento
a essas diretrizes e as peculiaridades do caso concreto, tenho que a valoração
dos danos foi bem calculada, dado o grau de culpa do infrator e da intensidade
da lesão injusta suportada pelo demandante, daí porque, descabido o seu pleito
alternativo da empresa ré, para reduzi-lo, posto que o montante arbitrado em R$
7.525,00 está apto a recompensar quantum satis do dano sofrido pelo autor, não
se convertendo em enriquecimento sem causa. Importante ter sempre em mente que
valor da indenização, consoante precedente do Superior Tribunal de Justiça, "não
pode contrariar o bom senso, mostrando-se manifestamente exagerado ou irrisório
" (RT 814/167).
Nesse
sentido já decidiu esta E. Corte:
“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
Uso indevido de fotografias de casamento por um sítio eletrônico. Violação de direitos
autorais. Arts. 7º, VII e 79, § 1º da Lei 9.610/98. Indenização devida a título
de danos morais e materiais. Recurso desprovido. Sentença mantida” . (Apelação
Cível 1010700-27.2014.8.26.0002, Relatora Desembargadora Mary Grün).
Ou ainda: “VOTO
DO RELATOR EMENTA DIREITO AUTORAL - INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS Cerceamento
de defesa Inocorrência Desnecessária dilação probatória para o deslinde da controvérsia
- Pedido de indenização por danos morais pela utilização de material fotográfico
do requerente Procedência - Ausente autorização, bem como indicação de autoria (crédito
da fotografia) Violação ao disposto no art. 79 e § 1º da Lei nº 9.610/98 Dano moral
que é presumido e decorre da indevida utilização de obra do autor - Indenização
fixada em R$ 12.900,00 Montante que se mostra adequado e atende à finalidade da
condenação Redução descabida Juros de mora Termo inicial corretamente fixado como
a data do evento danoso (Súmula 54 do C. STJ) - Sentença mantida Recurso improvido”
. (Apelação Cível 0188724-67.2009.8.26.0100, Relator Desembargador Salles
Rossi, 8ª Câmara de Direito Privado).
Por
fim, resta prejudicada a análise da condenação imposta na obrigação da empresa
ré de inserir os créditos/nome do autor nas fotografias que ilustraram as reportagens
nas páginas eletrônicas de notícias “R7”, sob pena de cominação de multa
diária, uma vez que houve inteiro cumprimento por parte daquela, conforme
noticiado às fls. 145/190, tanto que o ofendido se deu por satisfeito,
concordando com a quitação e extinção da obrigação de fazer (fl. 193).
Para
os fins do artigo 85, § 11º, do Código de Processo Civil, deixo de arbitrar
honorários advocatícios adicionais em favor do patrono do apelado, uma vez que
a fixação destes pelo julgador monocrático já atingiu o percentual máximo
determinado no § 2º do mesmo dispositivo legal.
3.
Ante
o exposto, meu voto nega provimento ao recurso.
Galdino Toledo Júnior Relator