Registro: 2020.0000754125
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível nº 1011731-09.2019.8.26.0002, da Comarca de São Paulo, em que é apelante CONVERSION SERVIÇOS DE MARKETING, PUBLICIDADE, TECNOLOGIA E CONSULTORIA EIRELI e apelada GUIA PERTO DE PUBLICIDADE NA INTERNET LTDA.
ACORDAM, em 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos.
Desembargadores SÉRGIO SHIMURA (Presidente) e RICARDO NEGRÃO.
São Paulo, 15 de setembro de 2020
GRAVA BRAZIL RELATOR
ASSINATURA ELETRÔNICA
APELAÇÃO CÍVEL Nº: 1011731-09.2019.8.26.0002
APELANTE: CONVERSION SERVIÇOS DE MARKETING, PUBLICIDADE, TECNOLOGIA E CONSULTORIA EIRELI
APELADA: GUIA PERTO DE PUBLICIDADE NA INTERNET LTDA COMARCA: SÃO PAULO
JUÍZA PROLATORA: RENATA MOTA MACIEL
Ação inibitória c.c. indenização por danos morais – Violação de marca mista – Sentença de improcedência – Inconformismo – Não acolhimento – A utilização de elemento nominativo de uso vulgar não garante proteção exclusiva – Análise do conjunto marcário – Ausência de correspondência entre as marcas – Manutenção integral da r. sentença – Fixação de honorários recursais – Recurso desprovido.
VOTO Nº 32456
1 - Trata-se de sentença que julgou improcedente ação inibitória c.c. indenização por danos morais ajuizada por Conversion Serviços de Marketing, Publicidade, Tecnologia e Consultoria EIRELI em face de Guia Perto de Publicidade na Internet Ltda. sob o entendimento de que “... caracterizado o uso comum da palavra “conversion”, afastada a ocorrência de similitude entre os conjuntos gráficos das partes, bem como esclarecida a controvérsia a respeito da coincidência das atividades praticadas pelas partes, ausente a conduta da concorrência desleal pela requerida, sendo de rigor a improcedência do pedido.”. Confira-se fls. 176/186.
Inconformada, a autora alega, inicialmente, a nulidade da r. sentença, em razão de cerceamento de defesa ocasionado pelo julgamento antecipado do mérito, que afastou o pleito autoral de produção de prova pericial, oral e documental.
No mérito, aduz que a r. sentença equivocadamente entendeu que o termo “conversion” , elemento nominativo da marca mista da autora, seria de uso vulgar e, portanto, não mereceria proteção marcária.
Nesse sentido, sustenta que o termo “conversion” remete exclusivamente à autora, tanto que o Google relaciona tal termo a seu site, o qual teve audiência de 1,4 milhões de usuários entre janeiro e novembro de 2019.
Utiliza-se de comparações entre pesquisas feitas na ferramenta do Google para concluir “... sem sombra de dúvida que o termo “Conversion” constitui marca nominativa registrada e amplamente reconhecida pelo mercado desde o ano de criação da APELANTE ...” (fls. 208).
Aduz que o termo “conversion” no mercado de marketing digital é utilizado apenas em conjunto com outros termos, compondo o que se chama de “conversion rate optimization” .
Sustenta que as agências de marketing mencionadas pela ré, por utilizarem o termo “conversion” em seu nome, não são brasileiras e, portanto, não concorrem no mesmo segmento de mercado da apelante.
Alega que a apelada também reproduz os elementos figurativos de sua marca, tais como o esquema de cores e os sinais gráficos.
Aduz não ser verdadeira a alegação da ré de que não atua no mesmo mercado que a autora, uma vez que comercializa produto que executa de forma automatizada o mesmo serviço prestado pela autora (fls. 189/219).
O preparo foi recolhido (fls. 220/221), sendo o recurso contrarrazoado (fls. 645/673), oportunidade em que a ré pugnou pela manutenção integral da r. sentença recorrida.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, o recurso fica, neste ato, recebido.
É o relatório, adotado, quanto ao mais, o da sentença apelada.
2 - Num primeiro momento, afasto a preliminar de nulidade da r. sentença em razão de cerceamento de defesa, visto que o feito comportava mesmo julgamento antecipado do mérito.
Conforme bem apontado pelo Juízo sentenciante, a produção de prova pericial e oral pretendida pela apelante in casu é absolutamente despicienda, porque a questão debatida é jurídica e não fática e os documentos juntados pelas partes se sobrepõem à realização de prova oral.
Nesse sentido, importante consignar que a jurisprudência deste C. Tribunal e do C. STJ colacionada ao recurso pela apelante trata de necessidade de prova pericial quando há violação de trade-dress (conjunto-imagem), o que não está sendo debatido no presente caso.
Ainda que assim não fosse, o Juízo quo é o destinatário das provas, de forma que a pertinência delas se submete a seu crivo, sendo que não se vislumbra qualquer mácula na r. sentença que, de forma fundamentada, dispensou a produção de provas e julgou antecipadamente o mérito.
Superada tal questão, passa-se à analise da alegada violação de direito marcário.
Narrou a apelante na exordial que é proprietária do registro n.º 903477416 perante o INPI, referente a seguinte marca mista:
Nesse sentido, entendendo que a marca utilizada pela apelada (a seguir reproduzida) violava seu direito marcário, incorrendo em concorrência desleal, a apelante ajuizou o presente feito para obter ordem de abstenção de uso de marca e a consequente indenização por danos morais.
Quando da análise do mérito, o Magistrado de primeira instância, considerando como fato incontroverso a propriedade de marca mista pela autora, consignou que “As marcas mistas, quando compostas por expressões distintivas, são protegidas tanto contra a imitação gráfica como contra a imitação visual, não ficando a tutela restrita à proteção do conjunto. No entanto, 'quando formadas por palavras comuns, as marcas mistas só são protegidas: pela grafia ou figura estilizada, sem gerarem proteção para o elemento nominativo' (SCHMIDT, Lélio Denicoli. Marcas: aquisição, exercício e extinção de direitos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019, p. 213, grifo nosso).” (fls. 180/181).
E por assim ser, o Magistrado sentenciante acabou constatando que o termo “conversion”, utilizado na marca da apelante, é de utilização vulgar e, portanto, não comporta, por si só, proteção marcária.
Estas foram as ponderações do Juízo a quo, as quais, diante da profundidade da análise do tema, são aqui reproduzidas e adotadas como razão de decidir (fls. 181/184):
“Por esse quadro, a análise do caso em questão deve levar em conta tratar-se de marca de apresentação mista, cujo termo "conversion" constitui palavra na língua inglesa e que pode ser traduzida para o português como "conversão", termo técnico utilizado na área de marketing digital. (...) Portanto, parece muito claro que a palavra conversão, sobretudo a partir do termo "taxa de conversão" é recorrente na área de marketing digital, tudo a indicar trate-se de termo comum ou vulgar, não obstante integre o conjunto misto da marca registrada pela autora, como elemento nominativo. A propósito do uso do termo na língua inglesa, a própria área de atuação da parte autora é descrita por palavra de etimologia inglesa, no caso marketing digital, a confirmar o uso corrente de anglicismos nesta área profissional, o que em nenhuma hipótese afasta, ao contrário, confirma, seja um termo comum naquela área. No mesmo sentido, ao efetuar-se busca pelos termos "conversion" e "marketing", também são encontradas várias menções, a reforçar-se seja um termo comum e vulgar na área em questão. A requerida apresenta, na fl. 86, cópia de tela em que reproduz uma busca digital com o seguinte parâmetro: “conversion termo utilizado no marketing digital”. Dessa busca, segundo o documento apresentado em língua portuguesa, retornaram “Cerca de 116.000 resultados (0,37segundos)”, entre os quais se encontra a informação fornecida por glossários de marketing digital, dando conta da existência do termo Conversion Rate Optimization (CRO), ou Otimização da Taxa de Conversão. No mesmo sentido, a requerida apresentou prints de páginas de internet (fls. 85/89), ao passo que autora impugnou genericamente o conteúdo das provas apresentadas, requerendo seu desentranhamento dos autos, por se tratar de documentos redigidos em língua estrangeira, questão afastada acima, como se viu. Note-se que em nenhum momento a autora contestou a validade ou veracidade dos documentos, limitando-se a impugnar seu conteúdo e a forma de apresentação. A tese apresentada pela parte autora, no sentido de que a requerida não logrou comprovar a existência de outras agências com o mesmo nome (fl. 113) também não afasta o argumento acima, pois para que a proteção ao elemento nominativo de marca mista seja afastada não é necessário que o termo seja utilizado em outras marcas ou estabelecimentos, mas apenas que seja uso comum na área de aplicação de suas atividades, o que, como visto, ficou comprovado. Portanto, o termo "conversion", por integrar a atividade empresarial prestada pela autora e, ainda que de forma reflexa, da requerida, constitui termo comum ou vulgar, razão pela qual a proteção marcária deve recair sobre o conjunto misto da marca registrada, composto de elemento nominativo e de elemento figurativo.”
E, partindo da premissa de que o elemento nominativo da marca mista da apelante é termo comum que não possui proteção exclusiva, o Juízo a quo analisou o conjunto marcário das partes e entendeu que inexiste violação ao direito de marca, julgando, assim, improcedente a pretensão autoral.
Referido entendimento deve ser mantido em sua integralidade, uma vez que os argumentos travados pela apelante em seu recurso não são capazes de infirmar as conclusões da r. sentença, sendo de rigor o desprovimento da apelação, conforme se passa a demonstrar.
Inicialmente, insta consignar que o fato do Google relacionar o termo “conversion” ao site da apelante, ou que este teve audiência de 1,4 milhões de usuários entre janeiro e novembro de 2019, não muda em nada a conclusão de que referido termo é de uso vulgar na área de atuação da apelante.
Além disso, não prospera a afirmação da apelante de que o termo “conversion” no mercado de marketing digital é utilizado apenas em conjunto com outros termos, uma vez que ficou demonstrado na r. sentença que referido termo e sua tradução para o português (“conversão”) são utilizados amplamente no estudo das “taxas de conversão” de assimilação de marcas.
Já os exemplos dados pela apelada de outras agências de marketing que utilizam o termo “conversion” em seu nome, a despeito de serem ou não brasileiras, só corrobora com a conclusão da r. sentença de que o termo é de uso vulgar na área de marketing.
Na verdade, o que se verifica, ao longo de toda a argumentação tecida na tentativa de infirmar a vulgaridade do termo “conversion”, é que a apelante pretende que seja dada proteção de marca nominativa à marca mista, o que não pode ser admitido.
Ora, se a apelante não dispõe do registro do termo “conversion” como marca nominativa, não pode pretender, como afirmou em seu apelo recursal, que se conclua que “sem sombra de dúvida que o termo 'Conversion' constitui marca nominativa registrada e amplamente reconhecida pelo mercado desde o ano de criação da APELANTE ...” (fls. 208 - grifamos).
Desta forma, considerando que a apelante é proprietária de marca mista com elemento nominativo de uso vulgar, na comparação dos conjuntos marcários das partes não vislumbro existir a alegada violação da marca da apelante.
Como bem apontou o Magistrado sentenciante, o quadro comparativo trazido aos autos, pela própria apelante, demonstra claramente que não há correspondência entre as marcas das partes (fls. 115):
Ora, a figura acima não deixa dúvidas de que há diferença entre os nomes das marcas (Conversion X GPConversion), seus logotipos, os tipos de fonte e tonalidades de azul utilizadas.
Por fim, considerando que o termo “conversion” utilizado pelas partes é de uso vulgar e, portanto, que a marca da apelante deve conviver com outras marcas que utilizam este termo, o fato de ambas atuarem ou não no mesmo ramo mercadológico não altera as conclusões aqui tecidas.
Pelo contrário, assim como a apelante deve tolerar o uso do termo “conversion” por outras empresas do mesmo ramo, também deve ser encarada como natural a colidência de termos como “search”, “social media”, “performance”, entre outros, na área de marketing digital.
Portanto, por qualquer ângulo que se analise a questão, é de rigor o desprovimento do presente recurso, mantendo-se a r. sentença recorrida em sua integralidade.
E, diante disso, são majorados os honorários advocatícios fixados pela r. sentença para 15% sobre o valor da causa, ex vi do art. 85, § 11, do CPC.
3 - Eventuais embargos declaratórios serão julgados em sessão virtual, salvo se manifestada oposição na própria petição de interposição dos embargos, nos termos da Resolução n.º 549/2011, do C. Órgão Especial, deste E. Tribunal de Justiça, entendendo-se o silêncio como concordância.
4 -Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso. É o voto.
DES. GRAVA BRAZIL - Relator