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Superior Tribunal de Justiça. REsp 1558683/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. P/ Acórdão Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 15 setembro 2016

br014-jpt

RECURSO ESPECIAL Nº 1.558.683 - SP (2015/0253997-2)

 

RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO MOURA RIBEIRO RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA
ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO - SP047579
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) - SP035225 ROBERTO MARQUES SOARES - SP015816
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S) - SP138983
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S) - DF020213

 

EMENTA

 

RECURSO ESPECIAL. DIREITO AUTORAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. REEXIBIÇÃO DA TELENOVELA "PANTANAL". VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO INEXISTENTE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. DANOS MATERIAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS SOBRE DIREITOS AUTORAIS. ALEGADA OFENSA AO ART. 3º DA LEI Nº 5.988/73 (ATUAL ART. 4º DA LEI Nº 9.610/98). INOCORRÊNCIA. RENÚNCIA EXPRESSA. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. OFENSA AO ART. 24, IV, DA LEI Nº 9.610/98 RECONHECIDA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

 

1. Não há violação ao art. 535 do CPC se foram analisadas as questões controvertidas objeto do recurso pelo Tribunal de origem, ainda que em sentido contrário à pretensão do recorrente.

 

2. O dissídio jurisprudencial não foi comprovado, pois além de indicar o dispositivo legal e transcrever os julgados apontados como paradigmas, cabia ao recorrente realizar o cotejo analítico, demonstrando-se a identidade das situações fáticas e a interpretação diversa dada ao mesmo dispositivo legal, o que não ocorreu.

 

3. Não há que se falar em ofensa do art. 3º da Lei nº 5.988/73 (atual art. 4º da Lei nº 9.610/98) diante da renúncia expressa aos direitos assegurados em contrato celebrado entre as partes. Nenhuma interpretação, ainda que restritiva, pode ser conferida de modo a determinar um sentido contrário ao que o próprio recorrente livremente manifestou no ajuste. Por isso a Turma, por maioria, entendeu pelo descabimento do dano material.

 

4. Na análise do dano moral incide a Lei nº 9.610/98 e o CC/02, uma vez que o fato gerador, a retransmissão da telenovela, ocorreu entre 9/6/2008 e 13/1/2009, na vigência desses diplomas legais.

 

5. A renúncia aos direitos patrimoniais provenientes da exploração econômica da obra do autor não pode ser extensível aos direitos de personalidade, incluído o de natureza moral, que são intransmissíveis, inalienáveis e irrenunciáveis. Inteligência do art. 24, IV, da Lei nº 9.610/98 e do art. 6 bis da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas (Decreto nº 75.699/75).

 

6. A garantia à integridade da obra intelectual objetiva evitar sua desnaturação ou desrespeito às características que identificam. Na hipótese dos autos, os danos morais são devidos uma vez que os cortes de cenas e supressões de diálogos na telenovela "Pantanal" atingiram a honra e a reputação do autor.

 

7. Recurso especial provido em parte.

 

ACÓRDÃO

 

Retifica-se a decisão proferida na sessão do dia 09/08/2016 para: Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro João Otávio de Noronha, acompanhando a divergência, vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, em dar parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Moura Ribeiro, que lavrará o acórdão. Vencidos os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze. Votaram com o Sr. MINISTRO MOURA RIBEIRO os Srs. Ministros João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso Sanseverino.

 

Brasília (DF), 15 de setembro de 2016(Data do Julgamento)

 

MINISTRO MOURA RIBEIRO
Relator

 

RECURSO ESPECIAL Nº 1.558.683 - SP (2015/0253997-2)

 

RELATÓRIO

 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator):

 

Trata-se de recurso especial interposto por BENEDITO RUY BARBOSA, com fundamento no art. 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro assim ementado:

 

"Ação condenatória cumulada com pedido de indenização por danos materiais e morais julgada parcialmente procedente, condenando o canal televisivo requerido ao pagamento de remuneração pela participação do autor na obra retransmitida (Pantanal), a ser apurada em arbitramento, além de condenar o requerente nas despesas processuais e honorários fixados. Insurgência de ambas as partes. Reiteração de agravo retido ao qual deve ser negado provimento. Presença do interesse de agir, sendo legítimas as partes. No mérito, acolhida das alegações da requerida. Existência de renúncia expressa, em caráter irrevogável e irretratável, ao direito de receber qualquer importância referente à novela, liberando sua reexibição, utilização e negociação com terceiros, independente de qualquer pagamento. Acórdão que apreciou o prosseguimento dos embargos de terceiro que não vincula o presente julgado. Fundamentação do acórdão que não transita em julgado, mas apenas seu dispositivo. Renúncia expressa que retira o direito de receber qualquer remuneração ou indenização patrimonial. Pedido de dano moral pelo corte de cenas e supressão de diálogos indeferido, já que não se pode imputar à requerida a responsabilidade pela inexistência nos originais adquiridos. Ausência de insurgência contra o valor dos honorários fixados, os quais restam mantidos. Nega-se provimento ao agravo retido e ao recurso do autor, na parte conhecida, acolhendo-se o recurso da requerida" (fl. 1.418).

 

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados.

 

O recorrente alega ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil ao argumento de que o "acórdão proferido nos Embargos de Declaração rejeitou o tema trazido à análise dos declaratórios, decidindo de forma diversa e por isto, incidiu em 'error in procedendo'" (fl. 1.462).

 

Sustenta contrariedade ao art. 3º da Lei nº 5.988/1973 afirmando que, por se tratar de direitos autorais, o negócio jurídico deve ser interpretado restritivamente, de modo que teria direito à indenização por danos materiais pela retransmissão pela recorrida, sem sua autorização e com indevidas alterações, da telenovela "Pantanal", da qual foi o escritor. Aduz, a propósito, divergência jurisprudencial, apontando como paradigma o acórdão proferido pela Quarta Turma nos autos do REsp 750.822/RS (Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 9/2/2010, DJe de 1º/3/2010).

 

Assevera ofensa aos arts. 25, inciso IV, da Lei nº 5.988/1973 e 24, inciso IV, e 105 da Lei nº 9.610/1998 ao argumento de que lhe deve ser assegurado indenização por dano morais, porquanto o laudo pericial constatou a reexibição da telenovela mediante ausência de trechos e cenas e supressão de diálogos, o que teria comprometido sua obra intelectual.

 

Defende violação dos arts. 927, parágrafo único, e 931 do Código Civil de 2002, afirmando que a hipótese é de responsabilidade objetiva e solidária, de modo que a obrigação de reparar o dano é da recorrida, independentemente de culpa, por ter sido "a responsável pela propagação do comprovado ilícito" (fl. 1.475).

 

Contrarrazões às fls. 1.529/1.538.

 

O recurso especial foi admitido pelo Tribunal de origem (fls. 1.540/1.542). É o relatório.

 

RECURSO ESPECIAL Nº 1.558.683 - SP (2015/0253997-2)

 

VOTO-VENCIDO

 

O EXMO. SR. MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (Relator):

 

A irresignação não merece prosperar.

 

1. Da origem

 

Os autos revelam que o recorrente - Benedito Ruy Barbosa -, em 12/10/1989, firmou com a extinta Rede Manchete de Televisão um contrato de prestação de serviços editoriais, no qual se comprometeu a escrever os textos literários da telenovela "Pantanal", e outro de cessão de direitos autorais, com prazo de vigência de 10 (dez) anos, a partir de 1990. A telenovela foi exibida entre 27 de março e 10 de dezembro de 1990.

 

Em 27/5/1995, as partes firmaram um acordo em que o recorrente renunciou expressamente, em caráter irrevogável e irretratável, ao direito de receber qualquer importância referente a todos os direitos e concessões ajustados.

 

Os direitos de exibição da telenovela foram cedidos pela extinta emissora para a TVSBT - Canal 4 de São Paulo S.A., recorrida, a qual, por sua vez, teria reexibido a obra entre 9 de junho de 2008 e 13 de janeiro de 2009 sem prévia autorização do recorrente e mediante cortes de cenas, o que motivou a propositura da presente ação ordinária de obrigação de não fazer, com pedido de tutela antecipada, cumulada com pedido de indenização por danos morais e materiais.

 

O pedido de antecipação de tutela foi indeferido.

 

A sentença julgou parcialmente procedente o pedido a fim de condenar a ré, ora recorrida, ao pagamento de remuneração ao autor, ora recorrente, pela sua participação na obra audiovisual que ela retransmitiu, conforme se apurar no arbitramento. O pedido de indenização por danos morais foi rejeitado ao fundamento de que a exibição da obra, com ou sem cortes, somente poderia atingir direito da extinta Rede Manchete, que seria a verdadeira autora, ou eventuais sucessores, não albergando, assim, o seu escritor (fls. 1.290/1.295).

 

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou provimento à apelação do ora recorrente e deu provimento à apelação da recorrida a fim de julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial. Entendeu que a renúncia assegurou à extinta emissora a liberdade para negociar com terceiros independentemente de qualquer pagamento ao escritor da obra. Indeferiu o pedido de indenização por dano moral ao fundamento de que, não obstante o laudo pericial comprovar a ausência de alguns trechos e cenas e supressão de diálogos, essa responsabilidade não poderia ser imputada à TVSBT - Canal 4 de São Paulo S.A. diante da presença dessas modificações nos originais cedidos (fls. 1.417/1.429).

 

2. Da alegada ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil

 

O recorrente sustenta ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil ao argumento de que o "acórdão proferido nos Embargos de Declaração rejeitou o tema trazido à análise dos declaratórios, decidindo de forma diversa e por isto, incidiu em 'error in procedendo" (fl. 1.462).

 

De início, não viola o dispositivo em tela nem importa negativa de prestação jurisdicional o acórdão que adota, para a resolução da causa, fundamentação suficiente, porém diversa da pretendida pelo recorrente, para decidir de modo integral a controvérsia posta.

 

A propósito:

 

"PROCESSO CIVIL. AGRAVO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO.
1. O artigo 535 do Código de Processo Civil dispõe sobre omissões, obscuridades ou contradições existentes nos julgados. Trata-se, pois, de recurso de fundamentação vinculada, restrito a situações em que se verifica a existência dos vícios na lei indicados.
2. Afasta-se a violação do art. 535 do CPC quando o decisório está claro e suficientemente fundamentado, decidindo integralmente a controvérsia.
(...)
4. Agravo regimental desprovido."

(AgRg no Ag 1.176.665/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 10/5/2011, DJe de 19/5/2011).

 

"RECURSO ESPECIAL - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - INOCORRÊNCIA - PRECLUSÃO - AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO AO FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO RECORRIDO - INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283/STF - TRANSAÇÃO E PRESCRIÇÃO - AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – INCIDÊNCIA DA SÚMULA 211/STJ - PRODUÇÃO DE PROVAS - CRITÉRIO DO MAGISTRADO - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - CERCEAMENTO DE DEFESA - OCORRÊNCIA, NA ESPÉCIE - RECURSO IMPROVIDO.
1. Os embargos de declaração consubstanciam-se no instrumento processual destinado à eliminação, do julgado embargado, de contradição, obscuridade ou omissão sobre tema cujo pronunciamento se impunha pelo Tribunal, não se prestando para promover a reapreciação do julgado.
(...)
6. Recurso improvido."

(REsp 1.134.690/PR, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/2/2011, DJe de 24/2/2011).

 

No caso em exame, a suscitada ofensa deve ser afastada, porquanto a Corte de origem examinou e decidiu, de modo claro e objetivo, as questões que delimitaram a controvérsia, não se verificando nenhum vício que possa nulificar o acórdão recorrido, tampouco a existência de error in procedendo.

 

3. Da divergência jurisprudencial

 

O recorrente aduz divergência jurisprudencial no tocante à "análise do princípio da restritividade dos negócios jurídicos em direito autoral" (fl. 1.478). Aponta como paradigma o acórdão proferido pela Quarta Turma nos autos do REsp 750.822/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, assim ementado:

 

"DIREITO AUTORAL. OBRAS FOTOGRÁFICAS PUBLICADAS SEM INDICAÇÃO DE AUTORIA. DANO MORAL. EXTENSÃO DO CONSENTIMENTO DO AUTOR DA OBRA. REEXAME DE PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 07.

 

1. Afigura-se despiciendo o rechaço, uma a uma, de todas as alegações deduzidas pelas partes, bastando ao órgão julgador que decline as razões jurídicas que embasaram a decisão, não sendo exigível que se reporte de modo específico a determinados preceitos legais.

 

2. O acórdão recorrido chegou à conclusão de não haver provas suficientes que indicassem a existência de acordo verbal. Com efeito, inviável a averiguação da existência de acordo verbal entre as partes, porquanto tal providência encontra óbice na Súmula 07 do STJ.

 

3. A dúvida quanto aos limites da cessão de direitos autorais milita sempre em favor do autor, cedente, e não em favor do cessionário, por força do art. 49, inciso VI, da Lei n.º 9.610 de 1998.

 

4. A simples circunstância de as fotografias terem sido publicadas sem a indicação de autoria - como restou incontroverso nos autos - é o bastante para render ensejo à reprimenda indenizatória por danos morais.

 

5. O valor da condenação por danos morais (R$ 15.000,00) deve ser mantido, uma vez não se distanciar dos parâmetros praticados por esta Corte.

 

6. Recurso especial não conhecido" (DJe de 1º/3/2010).

 

Assevera, no que interessa, que,

 

"(...)
Diferentemente do acórdão paradigma, o acórdão recorrido afastou a regra da restritividade diante da conclusão de que 'a vontade dos contratantes, principalmente do titular dos direitos autorais' foi a de inovar no instrumento denominado Acordo, que, segundo o acórdão, modificou o prazo de 10 anos estabelecido no Contrato de Cessão de Direitos Autorais, estabelecendo uma renúncia de direitos.
O cotejo dos dois casos demonstra uma clara divergência, pois, enquanto o acórdão paradigma dá correta aplicação da lei, diante da apuração sobre a existência ou não da extensão da cessão de direitos autorais, ainda assim, houve por bem aplicar a regra da interpretação dos negócios jurídicos, diante da dúvida quanto aos limites da cessão"
(fl. 1.481).

 

Nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do Código de Processo Civil e 255, §§ 1º e 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, inviável o conhecimento do recurso especial pela alínea "c" do permissivo constitucional quando não demonstrada, como no caso, a similitude fática entre as hipóteses confrontadas, inviabilizando a análise da divergência de interpretação da lei federal invocada.

 

Nesse sentido:

 

"RECURSO ESPECIAL - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - VALOR PATRIMONIAL DA AÇÃO - DECISÃO ACOBERTADA PELO MANTO DA COISA JULGADA MATERIAL - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA.
(...)
II. Não houve a comprovação da divergência, conforme as exigências contidas nos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255 do RISTJ, em razão da ausência de similitude fática com os paradigmas confrontados.
Recurso Especial improvido."

(REsp 1.131.621/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/12/2010, DJe 10/2/2011).

 

"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO PRETORIANO. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A dessemelhança fática entre o paradigma citado e o acórdão recorrido impede a configuração da divergência jurisprudencial, em virtude da ausência de tese divergente tratada por outro Tribunal a respeito do assunto discutido no recurso especial.
2. Agravo regimental a que se nega provimento."

(AgRg no REsp 1.100.486/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 3/5/2011, DJe 6/6/2011).

 

Na hipótese, o recorrente não logrou demonstrar que os acórdãos em confronto, a partir de semelhante base fática e da interpretação de um mesmo dispositivo de lei federal, adotaram posicionamentos divergentes.

 

O acórdão apontado como paradigma solucionou questão relacionada à interpretação restritiva de negócios jurídicos envolvendo direitos autorais, decorrente da utilização indevida de fotografias por terceiros sem indicação da autoria, e não a partir de renúncia existente em contrato de cessão de direitos, tal como no presente caso.

 

Desse modo, embora ambos os acórdãos em confronto tenham discutido a a interpretação restritiva dos negócios jurídicos sobre direitos autorais, as bases fáticas apresentam-se absolutamente distintas e não autorizam, por conseguinte, o conhecimento do recurso especial pela divergência jurisprudencial.

 

4. Da indenização por danos materiais

 

O recorrente sustenta que o acórdão recorrido contrariou a regra do art. 3º da Lei nº 5.988/1973, que dispõe:

 

"Art. 3º. Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre direitos autorais."

 

Ressalte-se que o conteúdo desse dispositivo foi reproduzido no art. 4º da revogadora Lei nº 9.610/1998.

 

Alega que, por se tratar de direitos autorais, o negócio jurídico em debate deve ser interpretado restritivamente, de modo que teria direito à indenização por danos materiais pela retransmissão, com modificações e sem sua autorização, da telenovela "Pantanal" pela TVSBT - Canal 4 de São Paulo S.A., ora recorrida.

 

De fato, a existência de dúvida a propósito do sentido e do alcance de cláusulas contratuais que envolvem direitos autorais deve ser dirimida sempre em favor do autor da obra, cedente, e não em favor do cessionário.

 

Os autos narram que o recorrente firmou, em 12/10/1989, com a extinta Rede Manchete, contrato de cessão de direitos autorais sobre a telenovela "Pantanal" com prazo de vigência de 10 (dez) anos. No entanto, antes do fim do prazo, em 27/4/1995, assinou um acordo com aquela emissora em que renunciou expressamente, em caráter irrevogável e irretratável, a todos os direitos e concessões ajustados em contrato, inclusive o de receber qualquer importância decorrente de futuras reexibições ou vendas da telenovela para o exterior.

 

Para melhor exame da alegada ofensa à lei federal, transcreve-se a cláusula de renúncia em discussão:

 

"(...)
5 - Fica ainda estipulado, neste ato, que o AUTOR renuncia expressamente, em caráter irrevogável e irretratável, ao direito de receber qualquer importância referente a todos os direitos e concessões ajustados nos Contratos já referidos, principalmente no que se refere a futuras reexibições ou vendas da novela O Pantanal para o exterior, ficando a TV MANCHETE totalmente liberada para reexibi-la, utilizá-la ou negociá-la com terceiros, independentemente de qualquer pagamento ao AUTOR"
(fl. 1.425).

 

Dessa forma, o Tribunal de origem entendeu, corretamente, que a renúncia ao direito de recebimento sobre qualquer valor a respeito da obra, de acordo com os termos do acordo firmado, conferiu à extinta emissora o direito de negociar livremente com terceiros, sem lhe fosse devida nenhuma importância a propósito.

 

Do voto condutor do julgado, transcreve-se o seguinte excerto que bem demonstra essa compreensão:

 

"(...)
Da leitura dessa cláusula verifica-se que o autor renunciou, de forma irrevogável e irretratável, ao direito de receber valores sobre a obra, ficando acertado que a TV Manchete ficaria totalmente liberada para, inclusive, negociar com terceiros, independentemente de qualquer pagamento ao autor.
Assim, diante dessa renúncia do autor, a TV Manchete ficou apta a ceder a terceiros os direitos de exibição da novela Pantanal. E foi o que ocorreu.
O autor Benedito Ruy Barbosa assinou referido contrato em pleno exercício de sua capacidade física e mental, não havendo qualquer alegação em contrário, e dessa forma, não pode pretender, era detrimento do que licitamente ajustou, alterar a renúncia de forma a pretender corrigir eventual tardio arrependimento.
Acresça-se que a possibilidade de cessão total dos direitos autorais de caráter patrimonial já havia sido aventada quando foi contratada, em 12/10/1989, originariamente, a cessão daqueles direitos pelo período de dez anos, o que indicava a disposição das partes, já naquela época, de tratarem no futuro a cessão total daqueles direitos autorais.
Tal circunstância influi, certamente, na interpretação dos sucessivos tratos havidos entre a emissora de televisão e o festejado autor, afastando a regra da restritividade, que deve ser adotada se outros elementos não lograrem clarear a vontade dos contratantes, principalmente do titular dos direitos autorais, o que não ocorre no caso dos autos.
A renúncia é ato de vontade unilateral que independe, até mesmo, para sua efetividade, de prévia remuneração.
Ainda mais por se tratar de direitos patrimoniais, disponíveis a qualquer momento"
(fls. 1.425/1.426).

 

Ademais, apresenta-se evidente que os efeitos da renúncia devem ser estendidos à emissora recorrida, que reexibiu a obra audiovisual, pois não mantinha com o recorrente sequer relação contratual. Não se apresenta justificável que a TVSBT se mostre obrigada a pagar valores que foram renunciados anteriormente, nos termos de acordo firmado com a extinta Rede Manchete.

 

De fato, diante da renúncia expressa aos direitos assegurados em contrato, nenhuma interpretação, ainda que restritiva, pode ser conferida à hipótese de modo a determinar um sentido contrário ao que o próprio recorrente livremente manifestou no ajuste. Quer dizer, não há como afastar a renúncia a fim de assegurar ao escritor o pagamento de alguma importância, remuneratória e indenizatória, decorrente do contrato de cessão de direitos firmado entre a extinta emissora e a recorrida.

 

Nesse contexto, sobressai a ausência de ofensa ao art. 3º da Lei nº 5.988/1973 (atual art. 4º da Lei nº 9.610/1998), de modo que é indevido ao recorrente qualquer valor a título de remuneração ou indenização de natureza material.

 

5. Da indenização por danos morais

 

O recorrente alega ofensa aos arts. 25, IV, da Lei nº 5.988/1973 e 24, IV, e 105 da Lei nº 9.610/1998 ao argumento de que, na condição de escritor da obra, deve-lhe ser assegurado indenização por dano moral, porquanto o laudo pericial constatou a reexibição, pela recorrida, da telenovela "Pantanal", mediante ausência de trechos e cenas e supressão de diálogos, o que teria comprometido sua obra intelectual.

 

Defende violação dos arts. 927, parágrafo único, e 931 do Código Civil de 2002, afirmando que a hipótese é de responsabilidade objetiva e solidária, de modo que a obrigação de reparar o dano é da recorrida, independentemente de culpa, por ter sido "a responsável pela propagação do comprovado ilícito" (fl. 1.475).

 

Cabe ressaltar que, na presente hipótese, a matéria relacionada à indenização por dano moral deve ser examinada à luz das disposições contidas na Lei nº 9.610/1998 e no Código Civil de 2002, haja vista que a questionada retransmissão da telenovela deu-se entre 9 de junho de 2008 e 13 de janeiro de 2009, na vigência desses diplomas legais. Assim, afasta-se a incidência da Lei nº 5.988/1973.

 

Preconizam os dispositivos da Lei nº 9.610/1998:

 

"Art. 24. São direitos morais do autor:
(...)
IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;
(...)
Art. 105. A transmissão e a retransmissão, por qualquer meio ou processo, e a comunicação ao público de obras artísticas, literárias e científicas, de interpretações e de fonogramas, realizadas mediante violação aos direitos de seus titulares, deverão ser imediatamente suspensas ou interrompidas pela autoridade judicial competente, sem prejuízo da multa diária pelo descumprimento e das demais indenizações cabíveis, independentemente das sanções penais aplicáveis; caso se comprove que o infrator é reincidente na violação aos direitos dos titulares de direitos de autor e conexos, o valor da multa poderá ser aumentado até o dobro."
(grifou-se)

 

Por sua vez, dispõe o Código Civil de 2002:

 

"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
(...)
Art. 931. Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação."
(grifou-se)

 

É oportuno registrar que a circunstância de o escritor da novela ter renunciado ao direito de auferir qualquer importância decorrente da cessão dos direitos da telenovela não impediria, se fosse o caso, o reconhecimento do direito à indenização por dano moral.

 

A renúncia aos direitos patrimoniais provenientes da exploração econômica da obra não pode ser extensível aos direitos da personalidade, incluído o de natureza moral, que são intransmissíveis, inalienáveis e irrenunciáveis. É o que se depreende dos arts. 11 do Código Civil de 2002 e 27 e 49, inciso I, da Lei nº 9.610/1998:

 

"Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.
(...)
Art. 27. Os direitos morais do autor são inalienáveis e irrenunciáveis.
(...)
Art. 49. Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em Direito, obedecidas as seguintes limitações:
I - a transmissão total compreende todos os direitos de autor, salvo os de natureza moral e os expressamente excluídos por ele;"
(grifou-se)

 

Essa característica da legislação ordinária foi abordada com proficiência por Leonardo Estevam de Assis Zanini (Direito de Autor. São Paulo: Saraiva, 2015, pág. 162), que, após fazer referência aos dispositivos supramencionados, asseverou:

 

"(...)
Como seria então possível compatibilizar as normas do Código Civil com a transmissão dos direitos patrimoniais e morais de autor?
Na verdade, não existe propriamente a transmissão dos direitos do autor. O que existe é a autorização, por parte de seu titular, para que terceira pessoa explore economicamente referido direito. Assim, a cessão de uso de um direito de personalidade não significa a transferência do direito em si mesmo, porquanto nessa hipótese o que está sendo permitido é apenas o uso do direito."
(grifou-se)

 

Com efeito, a cessão de direito autoral, por quaisquer dos meios admitidos, não alberga os de natureza moral, que são intransmissíveis, inalienáveis e irrenunciáveis, de modo que permanece incólume o direito do interessado de discutir sua violação, caso verificada a ocorrência de uma das hipóteses legais.

 

Em primeiro grau de jurisdição, o pedido de indenização por dano moral foi indeferido ao fundamento de que tão somente a extinta Rede Manchete, que ostenta a condição de autora, teria direito de ser indenizada por alguma conduta culposa da TVSBT - Canal 4 São Paulo S.A. pela alegada existência de cortes na retransmissão da telenovela "Pantanal".

 

De fato, o revogado art. 15 da Lei nº 5.988/1973 estabelecia: "Quando se tratar de obra realizada por diferentes pessoas, mas organizada por empresa singular ou coletiva e em seu nome utilizada, a esta caberá sua autoria." Ao autor do argumento literário era conferida o nome de coautor, nos termos do art. 16 daquele revogado diploma legal, que preconizava: "São co-autores da obra cinematográfica o autor do assunto ou argumento literário, musical ou litero musical, o diretor e o produtor."

 

No entanto, essa distinção legal não afasta por si só a pretensão deduzida por escritor de obra audiovisual, porquanto deve ser interpretada à luz da Constituição Federal, a qual, em seu art. 5º, inciso XXVIII, alínea "a", preconiza o direito fundamental à proteção da participação individual em obras coletivas.

 

De outra parte, nos termos do art. 5º, inciso VIII, alínea "h", da Lei nº 9.610/1998, obra coletiva é "criada por iniciativa, organização e responsabilidade de uma pessoa física ou jurídica, que a publica sob seu nome ou marca e que é constituída pela participação de diferentes autores, cujas contribuições se fundem numa criação autônoma". E não há dúvidas de que a telenovela constitui típica obra coletiva, pois exige a comunhão do indispensável trabalho de escritores, diretores, atores etc.

 

A propósito do tema, cabe transcrever a lição de Carlos Alberto Bittar (Direito do Autor. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, pág. 61):

 

"(...)
Obra coletiva é, por sua vez, aquela em cuja realização ingressam várias pessoas, cabendo a organização à pessoa natural ou jurídica, que em seu nome a utiliza posteriormente (art. 5º, inciso VIII, h). Os esforços dos elaboradores são reunidos e remunerados pela pessoa coletiva, a quem compete a coordenação de suas atividades, às quais se fundem, ao depois, no resultado objetivado (a obra em si: filme, novela); daí por que se lhe reconhecem direitos originários plenos sobre a obra resultante.
A características básica dessa espécie é a incindibilidade das diferentes elaborações (consoante princípio oriundo de decisão da jurisprudência no célere caso da Enciclopédia francesa), que se justifica, quanto ao reconhecimento do trabalho criativo do organizador. Entretanto, sempre que, pela autonomia estética, for possível a dissociação, sem perda de sua individualidade, haverá direito próprio para o respectivo criador (por exemplo, quanto ao texto na novela, a música no filme, a música no filme, o poema no anúncio). Esse direito foi constitucionalmente assegurado na Carta de 1988 (art. 5º, inciso XXVIII, alínea a)".

 

Desse modo, em se tratando de obra coletiva, os direitos originários plenos recaem sobre o organizador, que é seu titular. Aos colaboradores assegura-se, no entanto, a proteção na extensão de sua participação individual.

 

Ademais, os arts. 24, inciso IV, e 105 da Lei nº 9.610/1998 permitem a insurgência do autor contra a transmissão de obra que comprometa sua integridade, podendo opor-se a eventuais modificações.

 

Desse modo, não há óbice para que o recorrente, na condição de escritor, pleiteie indenização por dano moral decorrente da alegada supressão de seus textos na retransmissão da telenovela.

 

Contudo, o Tribunal de origem indeferiu o pedido do recorrente ao fundamento de que, apesar de o laudo pericial comprovar a ausência de alguns trechos e cenas e a supressão de diálogos, essa responsabilidade não poderia ser imputada à recorrida, pois essas modificações constavam nos próprios originais cedidos.

 

Do voto condutor do julgado, transcreve-se o seguinte excerto, que bem demonstra essa compreensão:

 

"(...)
De acordo com o laudo pericial de fls. 922 e seguintes, restou comprovada a ausência de alguns trechos e cenas e supressão de diálogos, contudo não se pode imputar à apelada a responsabilidade, já que não existiam nos originais adquiridos.
Não se podendo responsabilizar a apelada pelas supressões, impossível acolher o pedido de dano moral do autor"
(fl. 1.428).

 

Com efeito, a prova pericial reconheceu, a partir dos escritos e de outros elementos de prova fornecidos pelo recorrente, que as modificações havidas já constavam do material cedido pela extinta emissora (fls. 962/983). Quer dizer, os próprios originais albergavam as alterações questionadas, de modo que não pode ser exigida da recorrida a reparação de um dano que não cometeu.

 

Em outras palavras, as modificações impugnadas na presente ação estavam nas próprias fitas fornecidas pela extinta Rede Manchete, titular da obra. Por conseguinte, não obstante o efetivo desacordo da retransmissão com os textos elaborados pelo recorrente, não há dano moral a ser assegurado.

 

Por fim, rever esse entendimento, a fim de reconhecer responsabilidade de natureza civil atribuível à recorrida, em contraposição ao que remanesceu decidido pelo Tribunal de origem, demandaria o reexame de provas, providência vedada em recurso especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ.

 

6. Do dispositivo

 

Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial. É o voto.

 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

 

Número Registro: 2015/0253997-2 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.558.683 / SP

 

Números Origem: 00316885120088260405 01012008001369 102608 136908 316885120088260405
4050120080239385 4050120080316885 4050120090174098 60331444 6033144400
603314441 84509 8452009

 

PAUTA: 01/12/2015 JULGADO: 01/12/2015

 

Relator
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

 

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

 

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MÁRIO PIMENTEL ALBUQUERQUE

 

Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

 

AUTUAÇÃO

 

RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) ROBERTO MARQUES SOARES
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S)

 

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Direito Autoral

 

SUSTENTAÇÃO ORAL

 

Dr(a). CARLOS FERNANDO MATHIAS DE SOUZA, pela parte RECORRENTE: BENEDITO RUY BARBOSA

 

CERTIDÃO

 

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

 

Após o voto do Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, negando provimento ao recurso especial, no que foi acompanhado pelo Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze, pediu vista o Sr. Ministro Moura Ribeiro. Aguardam os Srs. Ministros João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso Sanseverino.

 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

 

Número Registro: 2015/0253997-2 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.558.683 / SP

 

Números Origem: 00316885120088260405 01012008001369 102608 136908 316885120088260405
4050120080239385 4050120080316885 4050120090174098 60331444 6033144400
603314441 84509 8452009

 

PAUTA: 01/12/2015 JULGADO: 23/02/2016

 

Relator
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

 

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA

 

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS ALPINO BIGONHA

 

Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

 

AUTUAÇÃO

 

RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) ROBERTO MARQUES SOARES
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S)

 

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Direito Autoral

 

CERTIDÃO

 

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

 

Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Moura Ribeiro, divergindo do voto do Sr. Ministro Relator, dando provimento ao recurso especial, pediu vista, antecipadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Aguarda o Sr. Ministro João Otávio de Noronha (Presidente).

 

RECURSO ESPECIAL Nº 1.558.683 - SP (2015/0253997-2) RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA

 

ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) ROBERTO MARQUES SOARES
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S)

 

VOTO-VISTA

 

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO:

 

Eminentes Colegas, pedi vista dos autos na sessão do dia 23 de fevereiro de 2016 para melhor exame da controvérsia, em razão da divergência inaugurada pelo eminente Ministro Moura Ribeiro, bem como em razão da sustentação oral realizada.

 

Relembro que os presentes autos versam acerca de ação proposta por Benedito Ruy Barbosa contra TVSBT Canal 4 de São Paulo S/A, com o objetivo de obter a reparação dos danos morais e materiais decorrentes da violação do direito de autor consubstanciada na reexibição da telenovela Pantanal entre junho de 2008 e janeiro de 2009 sem sua autorização e sem a devida contraprestação.

 

A recorrida TVSBT Canal 4 de São Paulo S/A adquiriu da massa falida da TV Manchete os direitos de exibição da novela Pantanal, de cujo argumento literário Benedito Ruy Barbosa é, de forma inconteste, o autor.

 

Segundo os fatos constantes do acórdão recorrido, bem como do voto do eminente Relator, Benedito Ruy Barbosa firmou com a extinta TV Manchete, em outubro de 1989, contrato de prestação de serviços editoriais e contrato de cessão dos direitos autorais pelo prazo de dez anos, tendo-se aventado, naquela ocasião, a possibilidade de aquisição definitiva dos direitos autorais em instrumento contratual futuro.

 

A telenovela foi devidamente exibida no ano de 1990.

 

Em abril de 1995, foi celebrado novo acordo mediante o qual houve a repactuação do pagamento, bem como a renúncia ao pagamento de qualquer outro valor pela TV Manchete, que poderia, inclusive, negociar a exibição da telenovela com terceiros.

 

A cláusula 5ª do referido acordo, segundo consta do acórdão recorrido, ficou redigida nos seguintes termos, verbis (fl. 1.425 e-STJ):

 

Fica ainda estipulado, neste ato, que o AUTOR renuncia expressamente, em caráter irrevogável e irretratável, ao direito de receber qualquer importância referente a todos os direitos e concessões ajustados nos Contratos já referidos, principalmente no que se refere a futuras reexibições ou vendas da novela "O Pantanal" para o exterior, ficando a TV MANCHETE totalmente liberada para reexibi-la, utilizá-la ou negociá-la com terceiros, independentemente de qualquer pagamento ao AUTOR.

 

A controvérsia central devolvida ao conhecimento desta Corte situa-se exatamente em torno da forma de interpretação dessa cláusula.

 

Rogando vênia ao eminente Relator, estou em acompanhar a divergência no sentido de que essa interpretação deve ser restritiva.

 

Com efeito, os direitos de autor, como bem ponderado pelo eminente Ministro Moura Ribeiro, constituem direitos fundamentais, consagrados pela Constituição Federal, em seu art. 5º, incisos XXVII e XXVIII, assegurando aos autores o direito exclusivo de utilização, publicação e reprodução de suas obras, sendo garantida, ademais, a proteção às participações individuais em obras coletivas.

 

Mais além do que garantias fundamentais, os direitos autorais constituem também direitos humanos, desfrutando de proteção no plano internacional, com eficácia erga omnes independentemente de registro, consoante previsto na Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas.

 

No caso em comento, conquanto o recorrente Benedito Ruy Barbosa não possa ser considerado autor exclusivo da telenovela em si, pois, como toda obra audiovisual, constitui, em última análise, uma obra coletiva, ele é, sem dúvidas, o autor do argumento literário no qual se baseou a obra Pantanal.

 

A utilização da obra por terceiros pressupõe a autorização prévia do autor, bem como o devido pagamento e, se é certo que o direito autoral, como expressão do direito da personalidade, é inalienável, a cessão dos direitos patrimoniais dele decorrentes é amplamente admitida pelo ordenamento jurídico, como forma de viabilizar a exploração comercial da obra e, assim, incentivar a criação humana mediante a devida remuneração do autor.

 

Pelo que se depreende dos autos, o direito autoral do recorrente Benedito Ruy Barbosa foi devidamente prestigiado pela extinta TV Manchete, que, por meio de contrato de prestação de serviços editoriais e de cessão de direitos autorais, obteve autorização para utilização da obra literária do autor, bem como garantiu-lhe a devida contraprestação.

 

O mesmo não se pode dizer quanto à recorrida TVSBT Canal 4 de São Paulo S/A, que, embora tenha adquirido, nos autos da falência da TV Manchete, os direitos de exibição da telenovela, não observou o direito do autor Benedito Ruy Barbosa, cuja obra configura a gênese daquela.

 

Se houve contrato de cessão de direitos autorais da obra literária Pantanal e renúncia a quaisquer outros pagamentos por parte de Benedito Ruy Barbosa, elas se dirigiram à TV Manchete e não à TVSBT Canal 4 de São Paulo S/A, com quem o autor não teve qualquer relação contratual.

 

Como bem ilustrado pelo eminente Ministro Moura Ribeiro, o instrumento de cessão de direitos autorais não pode "ser tratado como duplicata que pode ser cedida/endossada à infinidade até o seu pagamento".

 

Muito pelo contrário, a cessão de direitos autorais tem caráter intuitu personae, porquanto somente ao autor cabe escolher a quem quer conceder o direito de utilizar sua obra.

 

No caso, o autor não foi consultado acerca da possibilidade de reprodução da obra audiovisual baseada em seu texto e tampouco foi remunerado pela sua retransmissão que, certamente, gerou proveito econômico à recorrida.

 

Segundo o disposto no art. 3º da Lei n. 5.988/73, em texto reeditado pelo enunciado normativo do art. 4º da Lei n. 9.610/98, os negócios jurídicos acerca de direitos autorais devem ser interpretados restritivamente.

 

Assim, entendo que a já mencionada cláusula 5ª do acordo firmado entre o recorrente e a TV Manchete em 1995 deve ser interpretada como apta a liberar referida emissora - e somente ela - de qualquer novo pagamento ao autor da obra literária por eventuais reexibições ou vendas da telenovela, o que não afasta a obrigação de eventual comprador da obra audiovisual de observar os direitos autorais de Benedito Ruy Barbosa na hipótese de vir a utilizá-la publicamente, porquanto eles têm eficácia erga omnes e decorrem de normas constitucionais.

 

Portanto, entendo ser inafastável a obrigação da TVSBT Canal 4 de São Paulo S/A de indenizar o recorrente pela violação de seus direitos autorais, já que obteve proveito econômico de sua obra autoral sem a devida autorização e contraprestação.

 

Ademais, no que diz respeito aos danos morais, entendo que eles se apresentam in re ipsa, implementando-se no momento da própria violação do direito autoral, sendo despicienda qualquer discussão acerca da mutilação ou não da obra no caso em comento, o que terá relevância apenas como circunstância para balizar a quantificação da indenização.

 

Ante o exposto, rogando vênia ao eminente Relator, acompanho integralmente o voto do eminente Ministro Moura Ribeiro, dando provimento ao recurso especial.

 

É o voto.

 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

 

Número Registro: 2015/0253997-2 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.558.683 / SP

 

Números Origem: 00316885120088260405 01012008001369 102608 136908 316885120088260405
4050120080239385 4050120080316885 4050120090174098 60331444 6033144400
603314441 84509 8452009

 

PAUTA: 26/04/2016 JULGADO: 26/04/2016

 

Relator
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

 

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA

 

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. NÍVIO DE FREITAS SILVA FILHO

 

Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

 

AUTUAÇÃO

 

RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) ROBERTO MARQUES SOARES
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S)
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)

 

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Direito Autoral

 

CERTIDÃO

 

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

 

Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, acompanhando a divergência, dando provimento ao recurso especial, verificou-se o empate. Pediu vista, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.

 

RECURSO ESPECIAL Nº 1.558.683 - SP (2015/0253997-2) RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA
ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) ROBERTO MARQUES SOARES
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S)
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)

 

VOTO-VISTA

 

O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA:

 

Srs. Ministros, levando em conta os significativos votos que nortearam a divergência sobre o desfecho da demanda, pedi vista dos autos para analisar, com mais acuidade, as matérias postas em evidência no julgamento do presente recurso especial.

 

Permito-me expor, até mesmo para provocar a reflexão sobre a controvérsia, os seguintes pontos:

 

a) o recorrente, Benedito Ruy Barbosa, firmou com a TV Manchete contratos de prestação de serviços editoriais (compromisso de escrever a telenovela "Pantanal" para a emissora) e de cessão de direitos patrimoniais, dos quais emergiu o acordo firmado em 27/5/1995 entre as partes;

 

b) a reexibição da telenovela "Pantanal" pela recorrida, TVSBT – Canal 4 de São Paulo S.A., por força de cessão da extinta emissora, deu ensejo à ação ordinária de obrigação de não fazer com pedido de tutela antecipada e de indenização por danos morais e materiais ajuizada pelo recorrente em face da ausência de prévia e expressa autorização e com cortes de cenas da obra audiovisual;

 

c) a sentença julgou parcialmente procedente o pedido para condenar a ré, ora recorrida, ao pagamento de remuneração ao autor pela retransmissão da telenovela "Pantanal" mediante apuração por arbitramento;

 

d) o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento das respectivas apelações, negou provimento ao recurso do autor e deu provimento ao da ré para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial;

 

e) o recurso especial, fundado em ofensa aos arts. 535 do CPC/73, 3º, 25, IV, e 125 da Lei n. 5.988/1973, 927, parágrafo único, e 931 do Código Civil e 24, IV, e 105 da Lei n. 9.610/1998 e em divergência jurisprudencial, objetiva a reforma do acórdão recorrido para se acolher integralmente a pretensão de indenização por danos materiais e morais.

 

No contexto processual acima sintetizado, assumem relevo na discussão travada nos autos duas questões que, objeto de enfática argumentação desenvolvida pelo recorrente, passo a examiná-las.

 

A primeira questão, cuja motivação visa atingir a procedência do pedido reparatório de danos materiais, versa sobre a contrariedade ao art. 3º da Lei n. 5.988/1973, cujas disposições, reproduzidas no art. 4º da atual Lei n. 9.610/1998, expressam o seguinte:

 

"Art. 3º Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre os direitos autorais."

 

No presente apelo especial, sobre a matéria, inclusive com amparo em lições doutrinárias, foram apresentadas estas razões:

 

"O princípio geral da interpretação restrita está definido no regime do direito autoral desde 1957, como esclarece a doutrina especializada e está previsto desde as convenções sobre direitos do autor, 'fixado através da regras imperativas que, inclusive, exigem a especificação dos direitos cedidos no respectivo instrumento de negócio'.

 

O princípio geral da interpretação restritiva deve ser ainda mais latente em contratos que importam em cessão dos direitos de autor, isto porque 'é com a cessão de direitos autorais que se mostram mais sensíveis os pontos de contato, já que numa e noutra relação contratual existe a translação de direitos de um titular para o outro sobre determinada obra intelectual'.

 

É, pois, conclusão da doutrina especializada, inclusive a estrangeira, a necessidade de se aplicar o princípio geral da interpretação restritiva em favor do autor quanto aos limites da cessão de direitos, isto porque, 'na cessão, o autor não se despoja de seus direitos, senão nos limites objetivados'.

 

Entretanto, nada disto ocorreu no presente caso, quando o v. acórdão não somente contraria o princípio como também o ultrapassa por influência de, reprise-se, elementos subjetivos ligados à 'vontade dos contratantes, principalmente do titular dos direitos autorais'!

 

[...]

 

Mais uma vez, na dúvida, por força do princípio da interpretação restritiva, caberia ao v. acórdão aplicar o disposto no artigo 3º da Lei nº 5.988/73, cujo teor é o seguinte:

 

Art. 3º - Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre direitos autorais" (fls. 1.468-1.470).

 

Ainda que significativos os argumentos recursais, não vejo como me afastar da compreensão com base neles formada pelo relator, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, extraindo do seu voto os trechos a seguir:

 

"De fato, a existência de dúvida a propósito do sentido e do alcance de cláusulas contratuais que envolvem direitos autorais deve ser dirimida sempre em favor do autor da obra, cedente, e não em favor do cessionário.

 

Os autos narram que o recorrente firmou, em 12/10/1989, com a extinta Rede Manchete, contrato de cessão de direitos autorais sobre a telenovela 'Pantanal' com prazo de vigência de 10 (dez) anos. No entanto, antes do fim do prazo, em 27/4/1995, assinou um acordo com aquela emissora em que renunciou expressamente, em caráter irrevogável e irretratável, a todos os direitos e concessões ajustados em contrato, inclusive o de receber qualquer importância decorrente de futuras reexibições ou vendas da telenovela para o exterior.

 

Para melhor exame da alegada ofensa à lei federal, transcreve-se a cláusula de renúncia em discussão:

 

'[...]
5 - Fica ainda estipulado, neste ato, que o AUTOR renuncia expressamente, em caráter irrevogável e irretratável, ao direito de receber qualquer importância referente a todos os direitos e concessões ajustados nos Contratos já referidos, principalmente no que se refere a futuras reexibições ou vendas da novela O Pantanal para o exterior, ficando a TV MANCHETE totalmente liberada para reexibi-la, utilizá-la ou negociá-la com terceiros, independentemente de qualquer pagamento ao AUTOR' (fl. 1.425).

 

Dessa forma, o Tribunal de origem entendeu, corretamente, que a renúncia ao direito de recebimento sobre qualquer valor a respeito da obra, de acordo com os termos do acordo firmado, conferiu à extinta emissora o direito de negociar livremente com terceiros, sem lhe fosse devida nenhuma importância a propósito."

 

Com efeito, na interpretação atribuída ao negócio jurídico constituído entre o autor da telenovela "Pantanal" e a TV Manchete, o Tribunal a quo ateve-se aos termos e alcance do acordo que, subscrito por ato de vontade e disposição de Benedito Ruy Barbosa "em pleno exercício de sua capacidade física e mental" (fl. 1.426), veio a ser ulterior e definitivamente instrumentalizado diante das avenças antes firmadas pelas partes.

 

Dessarte, isento de qualquer desacerto ou vício o pronunciamento judicial da instância de origem sobre nítidas e objetivas condições contratuais do acordo formalizado entre a extinta emissora e o autor da obra audiovisual, não constato violação da regra prevista no art. 3º da Lei n. 5.988/1973.

 

Equivale dizer que a referida norma legal seria passível de obrigatória incidência se controversos fossem os propósitos e dimensão da cessão dos direitos autorais, por manifestas hipóteses de incerteza a respeito da natureza do contrato, de dúvida sobre os atos de vontade dos contratantes, de falta de clareza ou ambiguidade de cláusulas ou de contradição nas convenções, que, atingindo o próprio objeto do contrato, imporiam uma solução em favor do autor, cedente, e não em prol do cessionário.

 

A título de ilustração, colho sobre a matéria as lições de Eduardo Pimenta, assim expressas:

 

"O princípio da restritividade refere-se exclusivamente aos atos jurídicos, cujos contratos por vezes merecem ser interpretados. Emanando o princípio básico do in dubio pro autor, no qual as disposições conflitivas sobre o contrato, aplicar-se-á a mais favorável ao autor.
[...]
A Restritividade Interpretativa dos Negócios Jurídicos em essência implica a interpretação psicológica do contrato, que destina a investigar a intenção objetiva dos contraentes, ante as regras que o disciplinam, como um todo, segundo a intenção comum. E não, a interpretação das normas legais que disciplinam o contrato." (Princípios de Direitos Autorais. Livro I. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 347.)

 

Não evidenciando os autos nenhuma das hipóteses acima expostas nem motivação bastante para amparar a pretendida interpretação restritiva ao negócio jurídico descrito na lide, que, in casu, beneficie o autor da obra audiovisual, considero, tal como asseverado no acórdão recorrido, injustificável a condenação da TVSBT – Canal 4 de São Paulo S.A. ao pagamento de remuneração ou de indenização ao recorrente a título de danos materiais.

 

A segunda questão, que se circunscreve ao pleito indenizatório de danos morais, tem como fundamento a contrariedade aos arts. 25, IV, e 125 da Lei n. 5.988/1973; 927, parágrafo único, e 931 do Código Civil; 24, IV, e 105 da Lei n. 9.610/1998.

 

Antes de adentrar o específico exame dessa pretensão recursal, convém trazer à lembrança que os direitos autorais de obra intelectual devem ser visualizados sob uma dualidade de atributos: direito de natureza patrimonial e direito de caráter extrapatrimonial, isto é, detém o autor a titularidade de direitos material e moral ("Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou" – art. 22 da Lei n. 9.610/1998).

 

A propósito do tema, ensina Carlos Alberto Bittar que "cada bloco de direitos cumpre funções próprias: os direitos de cunho moral se relacionam à defesa da personalidade do criador, consistindo em verdadeiros óbices a qualquer ação de terceiros com respeito à sua criação; já os direitos de ordem patrimonial se referem à utilização econômica da obra, representando os meios pelos quais o autor dela pode retirar proventos pecuniários" (Direito de autor. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 68).

 

Relevante, pois, perceber que a doutrina especializada, a exemplo da exposta acima, pronuncia que os direitos patrimoniais do autor, diversamente dos direitos extrapatrimoniais, são passíveis de exploração econômica, sendo-lhe assegurado proveito pecuniário pelo trabalho intelectual (artístico, literário ou científico).

 

Primordial também observar que a formal exploração e negociação econômica dos direitos patrimoniais do autor já se modelava no instituto da "cessão" previsto na revogada Lei n. 5.988/1973 (arts. 52 e 53) e, atualmente, resguardado no instituto da "transferência" de que trata a Lei n. 9.610/1998 (arts. 49 e 50).

 

Nessa linha de raciocínio, deve-se distinguir os direitos extrapatrimoniais (considerados pela lei "morais") para, reconhecendo significativa amplitude em relação aos patrimoniais, impor obediência a atributos de direitos pessoais e imanentes decorrentes de perene liame entre o autor e sua criação – aqui presentes os princípios de identificação e vinculação do nome do autor à obra intelectual e de proteção a ela –, constituindo-se, portanto, numa espécie de direitos personalíssimos protegidos pela Constituição Federal, por isso inalienáveis e irrenunciáveis, além de imprescritíveis.

 

Para evitar tautologia, compartilho as reflexões do voto do Ministro Moura Ribeiro, que, amparadas em expressivas lições doutrinárias sobre o direito da personalidade, bem denotam o caráter imperativo de proteção ao direito moral do autor na hipótese de manifestação do seu intelecto mediante obras artísticas.

 

Precisamente sobre os direitos morais do autor, o art. 24, IV, da Lei n. 9.610/1998, dispositivo primordialmente suscitado em prol da postulação recursal, dispõe o seguinte:

 

"Art. 24. São direitos morais do autor: [...]

 

IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;"

 

Por oportuno, vale acrescer que a Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas – Decreto n. 75.699, de 6 de maio de 1975 – dispõe, no seu art. 6 bis, o seguinte:

 

"1) Independentemente dos direitos patrimoniais de autor, e mesmo depois da cessão dos citados direitos, o autor conserva o direito de reivindicar a paternidade da obra e de se opor a toda deformação, mutilação ou a qualquer dano à mesma obra, prejudiciais à sua honra ou à sua reputação."

 

Dessarte, considerando que a garantia à integridade da obra intelectual objetiva evitar sua desnaturação ou o desrespeito às características que a identificam, tenho por razoável a motivação em que se funda o apelo especial para pronunciar o cabimento de indenização por danos extrapatrimoniais, uma vez que os "cortes de cenas e supressões de diálogos" na telenovela "Pantanal", de autoria do recorrente, Benedito Ruy Barbosa, atingiram a honra e a reputação do autor e são, por si sós, capazes de configurar juridicamente os danos morais, aqui reconhecidos como danos in re ipsa.

 

Com as vênias dos que pensam em sentido contrário e diante da motivação fático-jurídica externada pelo Tribunal a quo e dos anteriores e judiciosos pronunciamentos, é esse o entendimento que julgo oportuno expressar nesta Turma.

 

Ante o exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe parcial provimento a fim de condenar a TVSBT – Canal 4 de São Paulo ao pagamento de indenização por danos extrapatrimoniais ao recorrente, a ser apurada por arbitramento na instância de origem e acrescida de honorários advocatícios, ora fixados em 15% sobre o valor da condenação.

 

Formulado pedido de indenização por danos morais e materiais, o acolhimento do pleito em relação aos primeiros implica sucumbência recíproca, na forma prevista no art. 21, caput, do CPC.

 

É o voto.

 

RECURSO ESPECIAL Nº 1.558.683 - SP (2015/0253997-2) RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA
ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) ROBERTO MARQUES SOARES
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S)
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)

 

EMENTA

 

RECURSO ESPECIAL. DIREITO AUTORAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. REEXIBIÇÃO DA TELENOVELA "PANTANAL". VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO INEXISTENTE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. DANOS MATERIAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS SOBRE DIREITOS AUTORAIS. ALEGADA OFENSA AO ART. 3º DA LEI Nº 5.988/73 (ATUAL ART. 4º DA LEI Nº 9.610/98). INOCORRÊNCIA. RENÚNCIA EXPRESSA. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. OFENSA AO ART. 24, IV, DA LEI Nº 9.610/98 RECONHECIDA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

 

1. Não há violação ao art. 535 do CPC se foram analisadas as questões controvertidas objeto do recurso pelo Tribunal de origem, ainda que em sentido contrário à pretensão do recorrente.

 

2. O dissídio jurisprudencial não foi comprovado, pois além de indicar o dispositivo legal e transcrever os julgados apontados como paradigmas, cabia ao recorrente realizar o cotejo analítico, demonstrando-se a identidade das situações fáticas e a interpretação diversa dada ao mesmo dispositivo legal, o que não ocorreu.

 

3. Não há que se falar em ofensa do art. 3º da Lei nº 5.988/73 (atual art. 4º da Lei nº 9.610/98) diante da renúncia expressa aos direitos assegurados em contrato celebrado entre as partes. Nenhuma interpretação, ainda que restritiva, pode ser conferida de modo a determinar um sentido contrário ao que o próprio recorrente livremente manifestou no ajuste. Por isso a Turma, por maioria, entendeu pelo descabimento do dano material.

 

4. Na análise do dano moral incide a Lei nº 9.610/98 e o CC/02, uma vez que o fato gerador, a retransmissão da telenovela, ocorreu entre 9/6/2008 e 13/1/2009, na vigência desses diplomas legais.

 

5. A renúncia aos direitos patrimoniais provenientes da exploração econômica da obra do autor não pode ser extensível aos direitos de personalidade, incluído o de natureza moral, que são intransmissíveis, inalienáveis e irrenunciáveis. Inteligência do art. 24, IV, da Lei nº 9.610/98 e do art. 6 bis da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas (Decreto nº 75.699/75).

 

6. A garantia à integridade da obra intelectual objetiva evitar sua desnaturação ou desrespeito às características que identificam. Na hipótese dos autos, os danos morais são devidos uma vez que os cortes de cenas e supressões de diálogos na telenovela "Pantanal" atingiram a honra e a reputação do autor.

 

7. Recurso especial provido em parte.

 

VOTO-VENCEDOR

 

O EXMO. SR. MINISTRO MOURA RIBEIRO:

 

A questão controvertida em debate visa definir se BENEDITO RUY BARBOSA (BENEDITO), autor de texto da telenovela "Pantanal", faz jus a indenização por danos materiais e morais em virtude da reexibição da obra audiovisual pela TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S.A. (SBT) sem sua prévia e expressa autorização e com cortes de cenas.

 

A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para condenar o SBT ao pagamento de remuneração a BENEDITO pela participação dele na obra audiovisual retransmitida, conforme se apurar em arbitramento. O pedido de indenização por danos morais não foi acolhido por se tratar de obra coletiva, sendo a verdadeira autora a MANCHETE, carecendo o escritor do roteiro de direito a ser indenizado a tal título.

 

O acórdão estadual deu provimento à apelação do SBT para julgar improcedentes os pedidos de BENEDITO, sob o fundamento de que ele não faz jus aos danos materiais porque expressamente renunciou a percepção de pagamento em decorrência das futuras reexibições da telenovela "Pantanal", autorizando a MANCHETE a negociar livremente com terceiros a obra audiovisual. O pedido de indenização por danos morais foi rejeitado porque a ausência de cenas e supressão de diálogos na telenovela não poderia ser imputada ao SBT, uma vez que tais supressões já constavam nos originais cedidos pela MANCHETE.

 

Após o voto do Ministro Relator, Ricardo Villas Bôas Cueva, negando provimento ao recurso especial, no que foi acompanhado pelo Ministro Marco Aurélio Bellizze, pedi vista dos autos em face da contrária sustentação apresentada na sessão de julgamento.

 

Na sessão de 23/2/2016, apresentei o seguinte voto-vista:

 

Pedi vista dos autos em razão da fundamentada solução adotada pelo Ministro Relator, Villas-Bôas Cueva, em face da contrária sustentação apresentada em sessão passada.

 

O voto do eminente Relator segue, em breve resumo, na esteira de que BENEDITO cedeu, com amplitude, seu direito de autor à MANCHETE e esta, posteriormente, os cedeu ao SBT que os adquiriu da massa falida daquela com aprovação judicial.

 

Já a sustentação, também em sua expressão mais simples, pondera que a alienação do direito do autor sobre a novela PANTANAL, não seria possível sem a sua aquiescência.

 

Por isso, postulou ele, BENEDITO, a obtenção de liminar que vedasse a exibição mutilada do seu trabalho pelo SBT, sob pena desta rede suportar o pagamento de indenização pelo direito moral do autor e pelos danos patrimoniais que tal exibição lhe causasse.

 

O fato delineador da obrigação de não fazer postulada foi esclarecido: o SBT estava exibindo seu trabalho literário de forma mutilada!

 

Portanto, se BENEDITO deu o fato, cabe ao Judiciário a solução acolhedora ou não do direito postulado.

 

Sobre o cerne da questão poderá se dizer que BENEDITO não se opôs à alienação que a massa falida da MANCHETE fez ao SBT.

 

É verdade, isso se poderá mesmo dizer.

 

Entretanto, e é aí que a sustentação toma vulto, com a seguinte indagação: será que o direito autoral, uma vez cedido, segue o mesmo destino de uma duplicata endossada?

 

Estava acompanhando o voto do eminente Ministro Relator quando, debruçado sobre o caso e estudando o direito da personalidade, onde tem assento o direito do autor, me dei conta de que talvez, não fosse o caso de se admitir a cessão pela cessão, sem a autorização de BENEDITO.

 

E assim pensei porque, segundo PONTES DE MIRANDA, o direito à personalidade é inato, no sentido que nasce com o indivíduo; é aquele poder "in se ipsum", [...] que não é direito sobre a própria pessoa: é direito que se irradia do fato jurídico da personalidade (= entrada, no mundo jurídico, do fato do nascimento do ser humano com vida). (Tratado de Direito Privado. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2012, Tomo VII, págs. 68 e 69).

 

E em assim pensando, lancei olhos em GUSTAVO TEPEDINO que em sua obra "Código Civil Interpretado", alerta para o fato de que somente no século XIX, a partir da elaboração das doutrinas francesa e alemã, que se começou a edificar a construção dos direitos atinentes à tutela da pessoa humana, considerados essenciais à esfera de proteção de sua dignidade e integridade, denominando-se-lhes direitos da personalidade (Renovar, vol. I, pág. 32).

 

E continuando a assim pensar, vi destacado na nossa Constituição Federal, os incisos V, X e XVII, do seu art. 5º, princípios expressos no sentido de proteger os autores de obras, de tal modo que a eles pertence o uso exclusivo de utilização, publicação e reprodução delas, só sendo transmissível aos herdeiros, nos termos da lei (inciso XVII).

 

Mais que isso, a proteção ao direito do autor é de tal monta que dele se preocupou o inciso XXVII, item 2, da Declaração Universal dos Direito Humanos, deixando ali construído o princípio de que todo ser humano tem direito à proteção dos interesses morais e materiais decorrentes de qualquer produção científica literária ou artística da qual seja autor.

 

Ora, se é certo que o direito do autor está protegido pelo direito da personalidade, que são direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a sua integridade física (vida, alimentos, ...), a sua integridade intelectual (liberdade de pensamento, autoria científica, artística e literária), e sua integridade moral (honra, recato, segredo pessoal, profissional e doméstico, imagem, identidade pessoal, familiar e social), como pondera MARIA HELENA DINIZ (Curso de Direito Civil. São Paulo: Ed. Saraiva, vol. 1, pág. 135), então, com o devido respeito, não se me afigura possível a cessão da cessão dos direitos autorais de BENEDITO sem a sua autorização.

 

Bem por isso, sou forçado a admitir, como o autor em que me amparo, que os direitos da personalidade têm caráter absoluto, com eficácia "erga omnes" (contra todos), principalmente se confrontados com os direitos pessoais puros, como os direitos obrigacionais e contratuais (TARTUCE, Flávio. Direito Civil. Rio de Janeiro: Ed. gen/Forense, 12ª edição, vol. 1, pág. 158).

 

E não é só: CARLOS ALBERTO BITTAR ensina com lucidez e na mesma toada sobre os direitos da personalidade que eles são inatos (originários), absolutos, extrapatrimoniais, intransmissíveis, imprescritíveis, impenhoráveis, vitalícios, necessários e oponíveis "erga omnes" (Os Direitos da Personalidade. 8ª edição. São Paulo: Ed. Saraiva, 2015, pág. 43).

 

Em arremate sobre as características dos direitos da personalidade, vem à luz a lição de FRANCISCO AMARAL para quem eles são inerentes à pessoa, intransmissíveis, inseparáveis do titular, e por isso se chamam, também, personalíssimos, pelo que se extinguem com a morte do titular. Consequentemente, são absolutos, indisponíveis, irrenunciáveis, imprescritíveis e extrapatrimoniais. [...] Indisponíveis, porque insuscetíveis de alienação, não podendo o titular a eles renunciar, por inerentes à pessoa, ou até limitá-los, salvo nos casos previstos em lei. Essa indisponibilidade não é, porém, absoluta, admitindo-se, por exemplo, no acordo que tenha por objeto direito da personalidade, como ocorre no caso de cessão do direito de imagem para fins de publicidade. (Direito Civil - Introdução. 8ª edição. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2014, pág. 303).

 

E vai de todos os ensinamentos transcritos, a lembrança ao inesquecível Enunciado nº 4 do CJF/STJ, que foi aprovado na I Jornada de Direito Civil, para sintetizar. Tem ele o seguinte teor: o exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja permanente nem geral.

 

Diante do contexto destacado e sopesando que o direito da personalidade é, à unanimidade dos autores, inato, absoluto, imprescritível, está amparado na Declaração Universal dos Diretos Humanos, na Constituição pátria e na Lei nº 9.610/98 (art. 27), não pode ser tratado como uma duplicata que pode ser cedida/endossada à infinidade até o seu pagamento.

 

Assim, se o autor da obra é o titular dos seus direitos morais, pelo reconhecimento da sua criação, ideias, personalidade e trabalho; se ele tem direito à integridade da obra, há que se entender com ALEXANDRE DE MORAIS que tal direito consiste na impossibilidade de alteração sem seu expresso consentimento [...] e mais que deles brotam direitos patrimoniais, consistentes na exploração comercial da obra, dependendo de autorização para qualquer forma de sua utilização. Bem por isso, prossegue, caso ocorra ofensa a esses direitos constitucionalmente consagrados, cumulam-se indenizações por dano moral e material (Constituição do Brasil Interpretada. 9ª edição. São Paulo: Atlas. 2013, pág. 219).

 

Nestas condições, com tal exuberância de direitos da personalidade, desnecessário era que BENEDITO impugnasse a alienação feita pela massa falida da MANCHETE ao SBT porque a todo e qualquer tempo ele poderia fazer valer os seus direitos absolutos de autor.

 

Por fim, acabei por pensar que por que se alterar, fracionar uma obra de arte sem a autorização do seu autor? Como se fracionar um livro de Vitor Hugo, de Cervantes? Uma tela de Goya? Claro que o caso de BENEDITO está bem longe disso e nem sequer vale a pena comparar. Mas, vale a pena este Tribunal da Cidadania começar a refletir sobre a obra humana, como uma criação inteira e protegida pelo direito autoral, que não pode seguir o mesmo destino de uma duplicata endossada inúmeras vezes.

 

Devo estar errado em minhas conclusões, admito.

 

Mas, não posso deixar de pensar em melhor amparar o direito do autor, coisa que talvez aqui no Brasil não esteja recebendo os melhores vernizes.

 

Escuso-me perante o em. Ministro Relator, mas, pelo meu voto, DOU PROVIMENTO ao recurso especial para condenar o SBT ao pagamento dos danos morais e patrimoniais sofridos por BENEDITO conforme vier a ser apurado em liquidação de sentença, tudo acrescido de honorários que fixo em 15% sobre o montante desta condenação.

 

O Ministro Paulo de Tarso Sanseverino pediu vista, proferindo voto acompanhando a divergência na sessão de 26/4/2016.

 

O voto de desempate foi proferido pelo Ministro Presidente João Otávio de Noronha, na sessão de 9/8/2016, no sentido de negar o direito aos danos patrimoniais e conceder a indenização por danos morais.

 

No voto, o e. Ministro Presidente ressaltou a renúncia expressa de BENEDITO a todos os direitos e concessões ajustados em contrato com a MANCHETE, inclusive o de receber qualquer importância decorrente de futuras reexibições ou vendas da telenovela para o exterior, concluindo não existir violação da regra prevista no art. 3º da Lei nº 5.988/73.

 

Quanto aos danos morais, vislumbrou violação do art. 24, IV, da Lei nº 9.610/98 e do art. 6 bis da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas (Decreto nº 75.699/75), porque a renúncia aos direitos patrimoniais provenientes da exploração econômica da obra do autor não pode ser extensível aos direitos de personalidade, incluído o de natureza moral, que são intransmissíveis, inalienáveis e irrenunciáveis.

 

Nesse sentido, entendeu que no caso dos autos os danos morais são devidos uma vez que os cortes de cenas e supressões de diálogos na telenovela "Pantanal" atingiram a honra e a reputação do autor.

 

Transcreve-se o voto de desempate:

 

Srs. Ministros, levando em conta os significativos votos que nortearam a divergência sobre o desfecho da demanda, pedi vista dos autos para analisar, com mais acuidade, as matérias postas em evidência no julgamento do presente recurso especial.

 

Permito-me expor, até mesmo para provocar a reflexão sobre a controvérsia, os seguintes pontos:

 

a) o recorrente, Benedito Ruy Barbosa, firmou com a TV Manchete contratos de prestação de serviços editoriais (compromisso de escrever a telenovela "Pantanal" para a emissora) e de cessão de direitos patrimoniais, dos quais emergiu o acordo firmado em 27/5/1995 entre as partes;

 

b) a reexibição da telenovela "Pantanal" pela recorrida, TVSBT – Canal 4 de São Paulo S.A., por força de cessão da extinta emissora, deu ensejo à ação ordinária de obrigação de não fazer com pedido de tutela antecipada e de indenização por danos morais e materiais ajuizada pelo recorrente em face da ausência de prévia e expressa autorização e com cortes de cenas da obra audiovisual;

 

c) a sentença julgou parcialmente procedente o pedido para condenar a ré, ora recorrida, ao pagamento de remuneração ao autor pela retransmissão da telenovela "Pantanal" mediante apuração por arbitramento;

 

d) o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento das respectivas apelações, negou provimento ao recurso do autor e deu provimento ao da ré para julgar improcedentes os pedidos formulados na inicial;

 

e) o recurso especial, fundado em ofensa aos arts. 535 do CPC/73, 3º, 25, IV, e 125 da Lei n. 5.988/1973, 927, parágrafo único, e 931 do Código Civil e 24, IV, e 105 da Lei n. 9.610/1998 e em divergência jurisprudencial, objetiva a reforma do acórdão recorrido para se acolher integralmente a pretensão de indenização por danos materiais e morais.

 

No contexto processual acima sintetizado, assumem relevo na discussão travada nos autos duas questões que, objeto de enfática argumentação desenvolvida pelo recorrente, passo a examiná-las.

 

A primeira questão, cuja motivação visa atingir a procedência do pedido reparatório de danos materiais, versa sobre a contrariedade ao art. 3º da Lei n. 5.988/1973, cujas disposições, reproduzidas no art. 4º da atual Lei n. 9.610/1998, expressam o seguinte:

 

"Art. 3º Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre os direitos autorais."

 

No presente apelo especial, sobre a matéria, inclusive com amparo em lições doutrinárias, foram apresentadas estas razões:

 

"O princípio geral da interpretação restrita está definido no regime do direito autoral desde 1957, como esclarece a doutrina especializada e está previsto desde as convenções sobre direitos do autor, 'fixado através da regras imperativas que, inclusive, exigem a especificação dos direitos cedidos no respectivo instrumento de negócio'.

 

O princípio geral da interpretação restritiva deve ser ainda mais latente em contratos que importam em cessão dos direitos de autor, isto porque 'é com a cessão de direitos autorais que se mostram mais sensíveis os pontos de contato, já que numa e noutra relação contratual existe a translação de direitos de um titular para o outro sobre determinada obra intelectual'.

 

É, pois, conclusão da doutrina especializada, inclusive a estrangeira, a necessidade de se aplicar o princípio geral da interpretação restritiva em favor do autor quanto aos limites da cessão de direitos, isto porque, 'na cessão, o autor não se despoja de seus direitos, senão nos limites objetivados'.

 

Entretanto, nada disto ocorreu no presente caso, quando o v. acórdão não somente contraria o princípio como também o ultrapassa por influência de, reprise-se, elementos subjetivos ligados à 'vontade dos contratantes, principalmente do titular dos direitos autorais'!

 

[...]

 

Mais uma vez, na dúvida, por força do princípio da interpretação restritiva, caberia ao v. acórdão aplicar o disposto no artigo 3º da Lei nº 5.988/73, cujo teor é o seguinte:

 

Art. 3º - Interpretam-se restritivamente os negócios jurídicos sobre direitos autorais" (fls. 1.468-1.470).

 

Ainda que significativos os argumentos recursais, não vejo como me afastar da compreensão com base neles formada pelo relator, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, extraindo do seu voto os trechos a seguir:

 

"De fato, a existência de dúvida a propósito do sentido e do alcance de cláusulas contratuais que envolvem direitos autorais deve ser dirimida sempre em favor do autor da obra, cedente, e não em favor do cessionário.

 

Os autos narram que o recorrente firmou, em 12/10/1989, com a extinta Rede Manchete, contrato de cessão de direitos autorais sobre a telenovela 'Pantanal' com prazo de vigência de 10 (dez) anos. No entanto, antes do fim do prazo, em 27/4/1995, assinou um acordo com aquela emissora em que renunciou expressamente, em caráter irrevogável e irretratável, a todos os direitos e concessões ajustados em contrato, inclusive o de receber qualquer importância decorrente de futuras reexibições ou vendas da telenovela para o exterior.

 

Para melhor exame da alegada ofensa à lei federal, transcreve-se a cláusula de renúncia em discussão:

 

'[...]

 

5 - Fica ainda estipulado, neste ato, que o AUTOR renuncia expressamente, em caráter irrevogável e irretratável, ao direito de receber qualquer importância referente a todos os direitos e concessões ajustados nos Contratos já referidos, principalmente no que se refere a futuras reexibições ou vendas da novela O Pantanal para o exterior, ficando a TV MANCHETE totalmente liberada para reexibi-la, utilizá-la ou negociá-la com terceiros, independentemente de qualquer pagamento ao AUTOR' (fl. 1.425).

 

Dessa forma, o Tribunal de origem entendeu, corretamente, que a renúncia ao direito de recebimento sobre qualquer valor a respeito da obra, de acordo com os termos do acordo firmado, conferiu à extinta emissora o direito de negociar livremente com terceiros, sem lhe fosse devida nenhuma importância a propósito."

 

Com efeito, na interpretação atribuída ao negócio jurídico constituído entre o autor da telenovela "Pantanal" e a TV Manchete, o Tribunal a quo ateve-se aos termos e alcance do acordo que, subscrito por ato de vontade e disposição de Benedito Ruy Barbosa "em pleno exercício de sua capacidade física e mental" (fl. 1.426), veio a ser ulterior e definitivamente instrumentalizado diante das avenças antes firmadas pelas partes.

 

Dessarte, isento de qualquer desacerto ou vício o pronunciamento judicial da instância de origem sobre nítidas e objetivas condições contratuais do acordo formalizado entre a extinta emissora e o autor da obra audiovisual, não constato violação da regra prevista no art. 3º da Lei n. 5.988/1973.

 

Equivale dizer que a referida norma legal seria passível de obrigatória incidência se controversos fossem os propósitos e dimensão da cessão dos direitos autorais, por manifestas hipóteses de incerteza a respeito da natureza do contrato, de dúvida sobre os atos de vontade dos contratantes, de falta de clareza ou ambiguidade de cláusulas ou de contradição nas convenções, que, atingindo o próprio objeto do contrato, imporiam uma solução em favor do autor, cedente, e não em prol do cessionário.

 

A título de ilustração, colho sobre a matéria as lições de Eduardo Pimenta, assim expressas:

 

"O princípio da restritividade refere-se exclusivamente aos atos jurídicos, cujos contratos por vezes merecem ser interpretados. Emanando o princípio básico do in dubio pro autor, no qual as disposições conflitivas sobre o contrato, aplicar-se-á a mais favorável ao autor.

 

[...]

 

A Restritividade Interpretativa dos Negócios Jurídicos em essência implica a interpretação psicológica do contrato, que destina a investigar a intenção objetiva dos contraentes, ante as regras que o disciplinam, como um todo, segundo a intenção comum. E não, a interpretação das normas legais que disciplinam o contrato." (Princípios de Direitos Autorais. Livro I. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 347.)

 

Não evidenciando os autos nenhuma das hipóteses acima expostas nem motivação bastante para amparar a pretendida interpretação restritiva ao negócio jurídico descrito na lide, que, in casu, beneficie o autor da obra audiovisual, considero, tal como asseverado no acórdão recorrido, injustificável a condenação da TVSBT – Canal 4 de São Paulo S.A. ao pagamento de remuneração ou de indenização ao recorrente a título de danos materiais.

 

A segunda questão, que se circunscreve ao pleito indenizatório de danos morais, tem como fundamento a contrariedade aos arts. 25, IV, e 125 da Lei n. 5.988/1973; 927, parágrafo único, e 931 do Código Civil; 24, IV, e 105 da Lei n. 9.610/1998.

 

Antes de adentrar o específico exame dessa pretensão recursal, convém trazer à lembrança que os direitos autorais de obra intelectual devem ser visualizados sob uma dualidade de atributos: direito de natureza patrimonial e direito de caráter extrapatrimonial, isto é, detém o autor a titularidade de direitos material e moral ("Pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou" – art. 22 da Lei n. 9.610/1998).

 

A propósito do tema, ensina Carlos Alberto Bittar que "cada bloco de direitos cumpre funções próprias: os direitos de cunho moral se relacionam à defesa da personalidade do criador, consistindo em verdadeiros óbices a qualquer ação de terceiros com respeito à sua criação; já os direitos de ordem patrimonial se referem à utilização econômica da obra, representando os meios pelos quais o autor dela pode retirar proventos pecuniários" (Direito de autor. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 68).

 

Relevante, pois, perceber que a doutrina especializada, a exemplo da exposta acima, pronuncia que os direitos patrimoniais do autor, diversamente dos direitos extrapatrimoniais, são passíveis de exploração econômica, sendo-lhe assegurado proveito pecuniário pelo trabalho intelectual (artístico, literário ou científico).

 

Primordial também observar que a formal exploração e negociação econômica dos direitos patrimoniais do autor já se modelava no instituto da "cessão" previsto na revogada Lei n. 5.988/1973 (arts. 52 e 53) e, atualmente, resguardado no instituto da "transferência" de que trata a Lei n. 9.610/1998 (arts. 49 e 50).

 

Nessa linha de raciocínio, deve-se distinguir os direitos extrapatrimoniais (considerados pela lei "morais") para, reconhecendo significativa amplitude em relação aos patrimoniais, impor obediência a atributos de direitos pessoais e imanentes decorrentes de perene liame entre o autor e sua criação – aqui presentes os princípios de identificação e vinculação do nome do autor à obra intelectual e de proteção a ela –, constituindo-se, portanto, numa espécie de direitos personalíssimos protegidos pela Constituição Federal, por isso inalienáveis e irrenunciáveis, além de imprescritíveis.

 

Para evitar tautologia, compartilho as reflexões do voto do Ministro Moura Ribeiro, que, amparadas em expressivas lições doutrinárias sobre o direito da personalidade, bem denotam o caráter imperativo de proteção ao direito moral do autor na hipótese de manifestação do seu intelecto mediante obras artísticas.

 

Precisamente sobre os direitos morais do autor, o art. 24, IV, da Lei n. 9.610/1998, dispositivo primordialmente suscitado em prol da postulação recursal, dispõe o seguinte:

 

"Art. 24. São direitos morais do autor: [...]

 

IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;"

 

Por oportuno, vale acrescer que a Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas – Decreto n. 75.699, de 6 de maio de 1975 – dispõe, no seu art. 6 bis, o seguinte:

 

"1) Independentemente dos direitos patrimoniais de autor, e mesmo depois da cessão dos citados direitos, o autor conserva o direito de reivindicar a paternidade da obra e de se opor a toda deformação, mutilação ou a qualquer dano à mesma obra, prejudiciais à sua honra ou à sua reputação."

 

Dessarte, considerando que a garantia à integridade da obra intelectual objetiva evitar sua desnaturação ou o desrespeito às características que a identificam, tenho por razoável a motivação em que se funda o apelo especial para pronunciar o cabimento de indenização por danos extrapatrimoniais, uma vez que os "cortes de cenas e supressões de diálogos" na telenovela "Pantanal", de autoria do recorrente, Benedito Ruy Barbosa, atingiram a honra e a reputação do autor e são, por si sós, capazes de configurar juridicamente os danos morais, aqui reconhecidos como danos in re ipsa.

 

Com as vênias dos que pensam em sentido contrário e diante da motivação fático-jurídica externada pelo Tribunal a quo e dos anteriores e judiciosos pronunciamentos, é esse o entendimento que julgo oportuno expressar nesta Turma.

 

Ante o exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe parcial provimento a fim de condenar a TVSBT – Canal 4 de São Paulo ao pagamento de indenização por danos extrapatrimoniais ao recorrente, a ser apurada por arbitramento na instância de origem e acrescida de honorários advocatícios, ora fixados em 15% sobre o valor da condenação.

 

Formulado pedido de indenização por danos morais e materiais, o acolhimento do pleito em relação aos primeiros implica sucumbência recíproca, na forma prevista no art. 21, caput, do CPC.

 

É o voto.

 

Desse modo, a Turma, por maioria, entendeu não configurado o direito à reparação patrimonial, resultando no parcial provimento do recurso especial para condenar o SBT ao pagamento dos danos morais sofridos por BENEDITO, a serem arbitrados na instância de origem. Formulado pedido de indenização por danos morais e materiais, o acolhimento do pleito em relação aos primeiros implica sucumbência recíproca, na forma prevista no art. 21, caput, do CPC.

 

Nestas condições, pelo meu voto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso especial.

 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

 

Número Registro: 2015/0253997-2 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.558.683 / SP

 

Números Origem: 00316885120088260405 01012008001369 102608 136908 316885120088260405
4050120080239385 4050120080316885 4050120090174098 60331444 6033144400
603314441 84509 8452009

 

PAUTA: 09/08/2016 JULGADO: 09/08/2016

 

Relator
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

 

Relator para Acórdão
Exmo. Sr. Ministro MOURA RIBEIRO

 

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA

 

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS ALPINO BIGONHA

 

Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

 

AUTUAÇÃO

 

RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) ROBERTO MARQUES SOARES
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S)
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S)

 

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Direito Autoral

 

CERTIDÃO

 

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

 

Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro João Otávio de Noronha, acompanhando a divergência, a Terceira Turma, por maioria, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Moura Ribeiro, que lavrará o acórdão. Vencidos os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze. Votaram com o Sr. Ministro Moura Ribeiro, os Srs. Ministros João Otávio de Noronha (Presidente) e Paulo de Tarso Sanseverino.

 

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

 

Número Registro: 2015/0253997-2 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.558.683 / SP

 

Números Origem: 00316885120088260405 01012008001369 102608 136908 316885120088260405
4050120080239385 4050120080316885 4050120090174098 60331444 6033144400
603314441 84509 8452009

 

PAUTA: 09/08/2016 JULGADO: 15/09/2016

 

Relator
Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA

 

Relator para Acórdão
Exmo. Sr. Ministro MOURA RIBEIRO

 

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE

 

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. CARLOS ALBERTO CARVALHO VILHENA

 

Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

 

AUTUAÇÃO

 

RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO - SP047579
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) - SP035225 ROBERTO MARQUES SOARES - SP015816
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S) - SP138983
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S) - DF020213

 

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Direito Autoral

 

CERTIDÃO

 

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

 

Retifica-se a decisão proferida na sessão do dia 09/08/2016 para: Prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro João Otávio de Noronha, acompanhando a divergência, a Terceira Turma, por maioria, deu parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Moura Ribeiro, que lavrará o acórdão. Vencidos os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze. Votaram com o Sr. Ministro Moura Ribeiro os Srs. Ministros João Otávio de Noronha e Paulo de Tarso Sanseverino.